Brasil não puniu como deveria os militares torturadores

Por Simão Zygband 

A Comissão da Verdade brasileira pegou leve contra os criminosos da ditadura

Um dos equívocos dos governos democráticos brasileiros, dos ex-presidentes Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, ao contrário de seus vizinhos fronteiriços, foi não punir os militares criminosos da ditadura militar.

Claro que não era uma tarefa fácil e é bastante compreensível que os governos democráticos tenham agido com extrema cautela para não melindrar os humores da caserna. Mas não poderia ter sido tão “bonzinho” contra assassinos sanguinários.

Mas como diz o ditado popular, no Brasil, tudo termina em samba e carnaval, até pela própria característica do povo brasileiro, um mix de brancos europeus (sobretudo portugueses), índios e negros. Esta mistura construiu um povo ordeiro e, de alguma forma, leniente com maus feitos, menos comum nos países de língua hispânica, por exemplo.

É evidente que esta impunidade reverbera até os dias de hoje e é um dos pais do bebê-diabo que ocupa a presidência da República. Bolsonaro é o filho legítimo dos anos de chumbo em que os militares estiveram nas sombras da república, ameaçando realizar um novo golpe, como aquele que apodreceu as instituições democráticas por longínquos 21 anos.

Agora mesmo, os militares voltam a ameaçar a democracia brasileira. São frutos desta história recente que não foi passada a limpo. Depois que o presidente da CPI da Pandemia, Omar Aziz (PSD-AM) deu voz de prisão ao ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde, Roberto Dias, acusado de pedir propina no caso da compra de vacinas indianas (Covaxin), ele também acusou o envolvimento de altas patentes das Forças Armadas na negociata.

Assim, os comandantes das Forças Armadas ameaçaram o presidente da CPI em nota conjunta do Exército, Marinha e Aeronáutica. Nesta quinta-feira, para completar o quadro de ameaças dos militares ao Parlamento e ao Supremo Tribunal Federal (STF), o Clube Militar soltou uma nota defendendo o posicionamento do Ministério da Defesa e da cúpula militar, que se manifestaram contra as acusações do senador.

Militares transpiram impunidade

Este tipo de ameaça só acontece por que o Brasil não puniu os torturadores e estas vozes que se insurgem agora contra as instituições democráticas são resultado destes mais de 50 anos de impunidade.

A vizinha Argentina, por exemplo, foi a que mais puniu militares golpistas. O país condenou mais de 200 militares e civis por envolvimento em prisões, torturas, desaparecimentos e mortes. Números de ONGs e organismos internacionais de defesa dos direitos humanos apontam que, entre 1976 e 1983, pelo menos 30 mil civis foram mortos.

No Chile, a mobilização para punir os responsáveis por crimes começou antes do fim da ditadura de Augusto Pinochet. A Comissão da Verdade sobre Prisão Política e Tortura, mais conhecida como Comissão Valech (presidida pelo bispo Sergio Valech) ouviu mais de 35 mil pessoas que sofreram abusos. No último relatório, a comissão apontou 40 mil vítimas oficiais da ditadura, sendo 3.225 mortos ou desaparecidos.

O número de condenações no Chile é baixo comparado ao caso argentino. O processo começou em 1994, com a condenação de 15 carabineiros e um civil à prisão perpétua. Em 2005, foi a vez do general Manuel Contreras, chefe da Dina (direção de inteligência da polícia chilena nos anos de chumbo) até 1977, e mais 15 ex-agentes serem condenados pela execução de 14 militantes.

Já o Uruguai conseguiu condenar dez militares, incluindo o ditador Gregorio Alvarez e o ex-presidente Juan María Bordaberry.

 

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