Sonia Castro Lopes
Lembro da primeira vez que ouvi o Rei. “Quero que você me aqueça nesse inverno e que tudo mais vá pro inferno.” Achei a letra meio bobinha, mas parei para escutar. Foi um sucesso estrondoso. Mesmo criança eu me encantava com as canções de Dolores Duran, Elizete Cardoso, as preferidas de mamãe. Gostava menos das de Nelson Gonçalves que papai cantava com voz de tenor desafinado embaixo do chuveiro. Com o tempo me tornei eclética. Passei a curtir Sarah Vaughan e Ângela Maria, Rolling Stones e The Fevers. Pode? Eu era assim, eu sou assim. A música me fisga e eu não tô nem aí, se é brega, se é cult, se é de protesto, se é alienada. Abertamente declarava minhas preferências por Elis e Chico, Caetano, Betânia, Gil e Gal. Com meus botões, curtia Detalhes.
De fato, havia uma paixão mal resolvida com Bebeto. Torcia o nariz pras músicas dele, mas na hora da fossa, de chorar o namoro terminado, de sonhar com a nova paixão que se insinuava era com ele que eu me virava. Nunca comprei um disco de Roberto Carlos, mas o ouvia no rádio do carro, no rádio-despertador (oh, coisa antiga), bem escondida, assim meio que envergonhada. Achava o estilo yê yê yê coisa de alienados, até saber da música que ele fez para Caetano no exílio. “Debaixo dos caracóis dos seus cabelos…” Fiquei sem entender, Caetano não fizera passeata contra as guitarras? Não era preciso entender, só sentir. Roberto fora carinhoso, solidário e por isso passei a olhá-lo com mais simpatia. Aliás, Caetano me ensinou a não ter preconceito com estilos musicais. Hoje, sou capaz de curtir tudo, com exceção de sertanejo, porque ninguém é de ferro e manifestações de sadomasoquismo, nem como fetiche. Deus me livre!
Mas Roberto me ganhou mesmo quando fez aquela série de músicas românticas, sensuais, tempos de paixão com Myriam Rios. Nossa, aquilo era de arrepiar. Cavalgada, Côncavo e Convexo, só pra citar duas delas. Houve uma dessa safra que me marcou. Brega toda vida, mas que eu cantava despudoradamente. “Os botões da blusa que você usava/ e meio confusa desabotoava/iam pouco a pouco me deixando ver/ no meio de tudo um pouco de você.” Nunca confessei a ninguém, mas essa música embalou um momento especial da minha vida.
A fase das mulheres gordinhas, baixinhas, totalmente fora do “shape ideal” não me agradaram, não me via representada. Mais uma vez, o preconceito. Também não me interessou a fase mística, a veia carola do Roberto. Mas me comovi com suas dores e lhe fui solidária nas perdas que sofreu. Por Nice, Lady Laura, Maria Rita. Admito que mesmo com altos e baixos, minha relação com o Rei sempre foi forte. Nunca me interessei por assistir a um show, mas confesso que não perdia um Especial de final de ano.
Hoje o Rei faz 80. Não é pouca coisa. Quantos artistas passaram 60 anos de carreira no topo do pódio musical? Poucos. Não é meu favorito, mas pelo conjunto da obra, eu o aprovo com quase louvor. Apesar do layout forçadamente jovial, dos cabelos escovados, da franja; apesar dos tocs, das manias, da carolice, das pieguices, Bebeto é nosso Sinatra, nosso Aznavour, nosso Julio Iglesias. É o galã da menopausa, o eterno romântico das balzaquianas que se estapeiam nos shows atrás das rosas vermelhas que ele lança à plateia. Vida longa, saúde e alegrias ao nosso Rei. “Como é grande o meu (nosso) amor por você…”
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Não gosto. Rei? Só se for da indústria cultural, que ele soube seguir como ninguém. Nunca me senti representada e o único verso que curto: td vai mal, td é igual, como dois e dois são cinco. RC não dá liga.
As posições políticas dele são péssimas. Mas o coração tem razões… Mee consolou nas dores de amor. E foram muitas.
Somos parecidas nas escolhas musicais. Só ouvi Roberto nas dores de cotovelo e meio escondida. Mamãe ouvia dia e noite, eu implicava. Sou MPB , francesa e amo óperas. Sertanejo me mata: crime perfeito. Adoro pinçar frases de músicas. Dele, tenho algumas. Nunca fui a um show nem comprei discos. Gosto muito quando canta com parceiros : Marisa Monte, Chico, Caetano, Ludmila , etc e sigamos.