Por Walter Falceta
Quase todo mundo já conhece a “capivara” desse elemento que assumiu a prefeitura de São Paulo depois da morte do tucano eleito para o cargo.
Agora, ele agrega a seu currículo uma ignomínia imperdoável. Vetou o projeto de lei do vereador Eliseu Gabriel (PSB) que modificava a denominação da praça ministro Alfredo Buzaid, no Itaim Bibi, para praça Lourenço Diaféria.
Mas quem são esses dois?
Alfredo Buzaid é dos piores brasileiros já nascidos, com uma extensa lista de desserviços à Nação.
Foi um entusiasmado integralista, adulador de Plínio Salgado, ou seja, militava numa versão nacionalista do fascismo mussolinista.
Apoiou o golpe botinudo de 1964 e se tornou ministro da Justiça de Médici, no mais sangrento momento da ditadura militar.
Era o canzarrão de guarda do AI-5, o Ato Institucional que suspendeu o estado democrático de direito em nosso país.
Foi um dos garantidores do nefando sistema de tortura e assassinato de presos políticos, ao negar ao cidadão perseguido o direito legítimo ao habeas corpus.
Em sua gravidade sonsa, vivia jurando que não havia perseguição política e tortura no Brasil.
Foi um dos propositores e aplicadores de medidas que suprimiram a liberdade de expressão. Proibiu os meios de comunicação, por exemplo, de noticiarem a epidemia de meningite, no início dos anos 1970.
Como efeito dessa obra maligna de desinformação, milhares de brasileiros morreram, especialmente crianças.
Anos depois, foi o rábula contratado pela família Maluf para livrá-la da punição pelos crimes cometidos no caso Lutfalla.
Filho de peixe, peixinho é. O filho de Buzaid foi apontado como um dos playboys que sequestraram, estupraram e depois mataram a menina Ana Lídia, à época com 7 anos de idade.
Mas quem foi Lourenço Diaféria? Bem, foi um dos mais brilhantes cronistas brasileiros, homem de reto caráter, competência profissional ímpar e enorme sensibilidade.
Sempre digo que foi uma das pessoas que me estimularam a fazer carreira no jornalismo. Nos bairros, ele ministrava interessantes palestras para jovens secundaristas. Tratava de comunicação, ética informativa e valor social da imprensa responsável.
Aqui, na biblioteca da Vila Formosa, convenceu-me de que o bom jornalismo era a mais larga via pela qual avançava a civilidade.
Em 1977, Lourenço Diaféria publicou o famoso texto “Herói. Morto. Nós”, em que rendia comovente homenagem ao sargento Silvio Hollembach, que, para salvar um menino, saltou no poço de ariranhas do zoológico de Brasília.
Obteve sucesso em sua missão. Atacado pelos animais, porém, morreria na sequência, em um hospital da cidade.
Nesse artigo, Diaféria comparava a nobreza destemida de Silvio ao patrono do Exército, Duque de Caxias, que bem conhecemos como o maldoso exterminador de gente na Guerra do Paraguai.
“O povo está cansado de espadas e de cavalos. O povo urina nos heróis de pedestal”, escreveu Diaféria. O resultado dessa manifestação de coragem e franqueza foi a prisão, decretada pelos brucutus fardados.
Lourenço era também um magnífico contador de histórias do cotidiano, emprestando voz aos calados e invisibilizados pelo sistema. De sua pena generosa, ganhávamos ânimo para lutar por paz, justiça e direitos.
Por fim, Diaféria escreveu a mais completa biografia de seu Sport Club Corinthians Paulista, contando a história do clube do proletariado.
As sagas das operárias e operários douram os capítulos de “Coração Corinthiano”, também uma narrativa sobre a luta dos trabalhadores por direitos e protagonismo social.
Em seu bizarro veto, publicado no Diário Oficial, Ricardo Nunes faz-se de tolo e alega que Buzaid nunca foi condenado por graves violações dos direitos humanos.
Trata-se, pois, de uma farsa, em um país que largou impunes os responsáveis pelas barbáries do regime de exceção.
Como escárnio, o alcaide ainda argumenta que Diaféria não consta no banco de referência em direitos humanos para a nomeação de logradouros. Despreza, pois, o fato de que já tenha ganho o Prêmio Vladimir Herzog nessa área.
O que nos resta é indignação. E perseverança na luta. Deixo meu abraço fraterno a familiares e amigos.
Não acabou! Sigamos na luta!