Ensino militarizado: recursos públicos jogados no ralo

Sonia Castro Lopes

Por Sonia Castro Lopes

Não bastasse o escândalo do MEC que drenou milhões do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) para prefeituras com fins eleitoreiros enriquecendo pastores evangélicos, escolas-fantasma, kit-robótica para unidades escolares onde nem luz havia, agora assistimos vultosos recursos sendo destinados às escolas cívico-militares (ECM) que vão se disseminando pelo país afora.

Já discorremos neste Portal sobre essas escolas, verdadeira obsessão do Presidente da República que pretende incorporar numa só instituição a escola e o quartel, ou seja, dois dos mais expressivos aparelhos ideológicos do Estado, na concepção do filósofo Louis Althusser. Para este pensador, a  escola, tal como a conhecemos, se estruturou a partir do surgimento e consolidação do capitalismo quando passou a cumprir a missão de socializar crianças e jovens de acordo com os princípios caros a esse sistema. Se, com raras exceções, tais instituições pregam até hoje valores como ordem, disciplina e obediência, as ECM vão além até porque desejam formar cidadãos totalmente submissos e acríticos diante de crenças religiosas e (falsamente) patrióticas que devem sobrepujar os verdadeiros valores humanísticos pregados por uma educação realmente libertadora.

Voltando às ECM, o valor destinado ao projeto em 2020, da ordem de R$18 milhões foi ampliado para R$64 milhões no corrente ano.  E pasmem! Apenas 0,1% dessas escolas pertencem à rede pública enquanto a maioria delas, de natureza privada, está sendo aquinhoada com verbas públicas para atender a uma quantidade irrisória de estudantes que não ultrapassa 0,3% daqueles atendidos pelas escolas públicas, onde falta não só internet para auxiliar estudantes mais pobres a recuperar as perdas sofridas durante a pandemia, mas até condições básicas de sobrevivência como luz e água potável.

Esse projeto faz parte das políticas governamentais para realocar militares da reserva que atuam como “monitores” nesses estabelecimentos “estimulando a prática dos valores e o culto aos símbolos nacionais.” Obviamente, nesses locais os alunos e suas famílias são induzidos a apoiar o atual governo, como ocorreu há um ano numa escola do Rio de Janeiro em que o diretor assegurava aos estudantes que “Nós somos nós e o resto é o resto”, além de propagar que o lema da escola era “Brasil acima de tudo, Deus acima de todos.”

Escola e quartel conjugados resultam num péssimo modelo educativo que drena recursos que deveriam ser aplicados na melhoria da educação básica pública, no aperfeiçoamento dos cursos de formação de professores, na reestruturação do ensino médio de modo a torná-lo mais eficiente para atender às demandas da sociedade contemporânea. As metas colocadas pelo Plano Nacional de Educação estão longe de serem alcançadas e o governo dissipa recursos nas tais ECM que propõem um ensino militarizado, onde o controle, a hierarquia e os castigos são preceitos básicos que se colocam na contramão de experiências verdadeiramente emancipatórias no campo educacional.

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