Por Simão Zygband
Confesso a decepção que foi o primeiro turno das eleições em São Paulo. Um banho de água fria no imaginário do bloco de centro-esquerda encabeçado por Guilherme Boulos como candidato a prefeito e Marta Suplicy de vice.
Mas estrategicamente há de se reconhecer a vitória que é o candidato da incompleta frente ampla ter sido colocado no segundo turno. Êxito este obtido também pelo seu adversário, Ricardo Nunes. Não é uma situação confortável para o representante do presidente Luiz Inácio Lula da Silva na capital paulista, que deverá enfrentar todo tipo de adversidade, comuns contra as candidaturas de esquerda: imprensa privada atuando contra ele, festival de fake-news, guerra virtual e cibernética baixa e rasteira, recursos abundantes dos adversários, sobretudo provenientes do governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas e do déspota Jair Bolsonaro.
No primeiro turno, reconheço, Guilherme Boulos deu conta do recado. Foi assertivo nos debates, criou uma nova linguagem de comunicação entre ele e a militância, ele mesmo fazendo uma série de vídeos dando linha para a condução da luta política que todos nós estamos travando contra a direita e extrema direita, se transformando em um líder jovem, determinado, corajoso, que tem a intenção de se tornar prefeito de São Paulo. Tem todos os predicados.
Ingenuamente, entretanto, supunha-se existir uma fragilidade de um bolsonarismo derrotado por Lula nas urnas, suplantado inclusive no município de São Paulo, mas que evidentemente não se reproduz da mesma maneira nas eleições municipais, pois Boulos não é Lula, e o eleitorado de São Paulo sempre foi muito conservador, exceto em três únicas oportunidades quando o PT elegeu seus prefeitos: Luiza Erundina, Marta Suplicy e Fernando Haddad, que não conseguiram sua respectivas reeleições.
A pergunta que se faz internamente na frente de esquerda, desde que se conheceram os resultados das urnas no último domingo é como Guilherme Boulos poderá derrotar adversário tão poderoso, com a máquina nas mãos, com forte penetração nas periferias com o voto evangélico, quebrando inclusive parte do tradicional eleitorado do PT?
Esta é a equação que a coordenação de campanha de Boulos terá de resolver. A direita bolsonarista chegou dividida no primeiro turno entre Ricardo Nunes e Pablo Marçal, mas conseguiu fazer o primeiro e o terceiro colocado. A soma deles torna a missão do candidato de Lula extremamente difícil, mas não impossível. Mas terá que fazer alguns ajustes nos rumos da campanha e com Guilherme extremamente disciplinado, há alguma chance de sucesso.
Eu mesmo participei de uma eleição no Paraná, do ex-governador Roberto Requião, que chegou ao segundo turno quase sem chances de vitória contra o seu adversário, José Carlos Martinez, que fechou o primeiro turno com mais de 20% de votos na frente, O dinheiro da campanha praticamente minguou, parte dos aliados se bandearam para o outro lado, e o clima na produtora de TV do horário eleitoral era de absoluta derrota. Uma ressaca gigantesca.
Mas, o que virou a campanha foi a disciplina do grupo e a determinação. Se faz necessário azeitar a coordenação na campanha de Boulos. Não se pode mais errar. Ele necessariamente terá que conquistar votos de quem preferiu apostar em Pablo Marçal e ainda contar com a transferência dos votos de Tábata Amaral.
Não será uma tarefa fácil. Precisa ousar lutar para ousar vencer, como pregava o revolucionário Carlos Lamarca.
Boulos tem chances de se tornar prefeito. O mar, como dizem os navegadores, está revolto e muitas vezes ilógico. Mas precisa, desde ontem, acertar a mão. Afinal, Ricardo Nunes continua sendo um prefeito medíocre, péssimo de debate, que sente o golpe como um pugilista que tem “queixo de vidro”.
Bate direito que ele cai.
Simão Zygband é jornalista com passagens por jornais e TVs de São Paulo. Produziu campanhas eleitorais, algumas vitoriosas.