Uma marca que não cicatriza

Por Léo Bueno 

O fascismo não funciona numa cadeia rigorosa de ordens. É um amontoado de recalques transformado em psicose coletiva em uma sociedade ignorante de si mesma 

Já me acusaram, en passant, de deixar-me trapacear por certo diversionismo do discurso da turma Trump-Musk, da mesma maneira que me acusavam de dar cartaz para palavras violentas do ex-presidente do Brasil, ora inelegível.

Quem falou essas coisas não sabe nada dos MSM, os Meios de Comunicação de Massa. Ou do fascismo.

Acreditar que o discurso de Trump contra imigrantes ou que a mão estendida de Musk são apenas estratégias, na prática inofensivas, para desviar a atenção de questões econômicas ou geopolíticas é ignorar toda cadeia de logística violenta que se monta numa sociedade – capitalista, pois é no capitalismo que o fascismo grassa.

Os voos de deportação de brasileiros clandestinos nos EUA estão acontecendo numa base mensal desde 2017. Foram criados pelo governo Trump e não foram descontinuados pelo governo Biden.

Agora, com a nova posse de Trump, eles voltaram a atrair atenção, até por causa das promessas do reempossado presidente para incrementar a expulsão de estrangeiros.

E então surgiram estes relatos: os deportados estão sendo espancados por agentes estadunidenses em pleno ar.

Qualquer que seja a modalidade a encaixar tamanhos maus-tratos na área do Direito – se agressão, tortura, truculência, sabe-se lá -, cumpre constatar, por óbvio, que não houve publicamente ordem do primeiro escalão do governo ianque para que seus agentes agredissem prisioneiros brasileiros (cujo crime inexiste – clandestinos não são, por definição, malfeitores; se fossem, daria, ou devia dar, no mesmo: os EUA são signatários das mesmas declarações de direitos humanos que o Brasil também já assinou).

O que aconteceu foi a emergência dos pequenos poderes: o pequeno, minúsculo agente estatal que sentiu-se poderoso o bastante para bater, agredir, espancar impunemente um, ou dois, ou três, ou 88 – número altamente simbólico – cidadãos brasileiros em céus internacionais.

O pequeno tiranete, com o perdão da redundância, é figura típica da sociedade fascista. Existe fora dela, mas nela aflora, como um sintoma.

Quem lhe deu esse poder, aí sim, foi a fala de Trump. Foi o gesto nazista de Musk. Foram os discursos triunfantes de seus apoiadores nas rádios estadunidenses. Foram os bailes pós-posse. Foi o puxassaquismo dos subs de subs brasileiros, curiosamente barrados nesses mesmos bailes.

Pois o fascismo não funciona numa cadeia rigorosa de ordens. É um amontoado de recalques transformado em psicose coletiva por uma sociedade ignorante de si mesma. E é também, disse Brecht, uma cadela sempre no cio.

Que acaba de parir sua maior ninhada.

O cumprimento nazista de Musk gerou essa mancha roxa.

Léo Bueno é jornalista 

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