O pior lugar do mundo para se estar neste momento

Por Simão Zygband  

Ilustração do Duke

No começo da pandemia, que agora completa um ano quando foi detectada no Brasil (mas há versões de que ela já estava em solo pátrio durante o Carnaval de 2020), muito empresários bolsonaristas desdenharam da doença que está matando perto de 2.500 pessoas por dia.

Estavam seguindo a lógica de seu “mito”, o controverso presidente (sic), Jair Bolsonaro, que disse se tratar de uma “gripezinha” e também de suas cartilhas de pensamento neoliberal de que o mundo dos negócios está acima da vida (desde que não seja a deles, claro).

Três empresários, apoiadores incondicionais de Bolsonaro, inclusive com recursos que foram injetados ilegalmente na campanha do capitão reformado (como revelou o jornal Folha de S. Paulo), não foram felizes em seus palpites e erraram longe os seus prognósticos.
Junior Durski, dono da rede de restaurantes Madero, fez um vídeo postado nas redes sociais dizendo: “Não podemos parar por conta de 5 mil pessoas ou 7 mil pessoas que vão morrer. Tava melhorando muito, o Brasil tem que continuar trabalhando. Não podem simplesmente os infectologistas decidirem que tem que todo mundo parar.”

Roberto Justus, empresário conhecido pelo programa “O Aprendiz”, deveria ter sido demitido sumariamente se dele dependesse salvar vidas. Ele achava que a economia se sobrepõe à luta contra a Covid-19.
Justus enviou um áudio em um grupo de WhatsApp e classificando a Covid-19 como uma “gripezinha” e classificou os alertas como “histeria”:
“Vai custar muito caro. Você está preocupado com os pobres? Você vai ver a vida devastada da humanidade na hora do colapso econômico, da recessão mundial, dos pobres não ter o que comer, das empresas fecharem, do desemprego em massa, não dá pra comparar com um virusinho, que é uma gripezinha leve para 90% das pessoas”.

Depois, o empresário faz uma análise dos pobres nas favelas, uma “molecada” que nem doente fica . “Não tem nenhuma pessoa que morreu que não tivesse outras doenças. Na pessoa saudável, zero, e na favela não tem só gente doente, não. Não vai acontecer porra nenhuma se o vírus entrar na favela, pelo contrário. Essa molecada que tá na favela nem pegam a doença.”, diz o empresário.

Já Luciano Hang, dono da rede de lojas varejistas Havan, o mais notório defensor do capitão reformado, que em vídeo reconheceu ter bancado junto com outros empresários disparos ilegais de whatsapp na campanha presidencial, não apenas foi contaminado pelo vírus que ele desprezava (e entrou na Justiça pela manutenção de suas lojas abertas durante a pandemia), como perdeu sua mãe Regina Modesti Hang, de 82 anos.

O “Véio da Havan”, como é conhecido nas redes sociais, costuma contestar o isolamento social e usar as redes sociais para defender o uso de hidroxicloroquina.

Lula pega pesado

Na contramão dos bolsonaristas, o ex-presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, em recente discurso, não deixou de abordar o assunto:

“Eu tenho 75 anos de idade e na semana que vem, se Deus quiser, eu vou tomar a minha vacina. Não me importa de que país, não me importa se é duas ou uma só; vou tomar minha vacina e quero fazer propaganda pro povo brasileiro”.

“Não siga nenhuma decisão imbecil do presidente da República ou do ministro da Saúde. Tome vacina. Tome vacina porque a vacina é uma das coisas que pode livrar você do Covid. Esse vírus, essa noite, matou quase 2 mil pessoas. É que as mortes estão sendo naturalizadas, mas eram mortes que, muitas delas, poderiam ser evitadas. Evitadas se a gente tivesse um governo que tivesse feito o elementar”, disse o ex-presidente.

“Você sabe que a arte de governar não é fácil; é a arte de saber tomar decisão”, continuou ele. “Então, o presidente da República que se respeitasse e que respeitasse o povo brasileiro, a primeira coisa que ele teria feito em março do ano passado, era criar um comitê de crise envolvendo o seu ministro da Saúde, envolvendo secretários da Saúde dos estados, envolvendo cientistas da Fiocruz, cientistas do Butantan e outros cientistas. E toda semana orientar a sociedade brasileira sobre o que fazer”.

Lula disse ainda que era preciso priorizar o dinheiro e comprar as vacinas que pudesse comprar em qualquer lugar do planeta Terra. “Nós tivemos momentos que teve vacina que a gente sequer aceitou. A própria Pfizer tentou oferecer vacina, e a gente não quis seguir a Organização Mundial da Saúde”.

O ex-presidente diz ainda que Bolsonaro preferiu inventar uma tal de cloroquina. “Nós tínhamos um presidente que falava que quem tem medo do Covid é “maricas”, que o Covid era uma gripezinha, que o Covid era coisa de covarde, que ele era ex-atleta, e que portanto ele não ia pegar. Esse não é o papel, no mundo civilizado, de um presidente da República”.

Negacionismo

Lógico que o negacionismo (esta característica de tentar negar o óbvio), encontra eco entre os seguidores do capitão reformado e não é só uma condição dos grandes empresários bolsonaristas. Também o lojista, o pequeno empresário, também se rebela contra ações restritivas contra o fechamento de seus estabelecimentos.

Não é raro, em São Paulo, aqueles que rosnam contra o governador João Doria, também um ex-apoiador arrependido de Bolsonaro, por que ele determina restrições que já deveriam ter sido tomadas há muito tempo.

Mas a epidemia parece estar em total descontrole e os números mostram que os brasileiros poderão enfrentar ainda este grande pesadelo por muitos meses, sobretudo pela falta de vacinas para todos e pela falta de empenho dos governantes para exigir que as pessoas fiquem em casa, mantenham o isolamento, realizem o distanciamento social e utilizem máscaras e álcool gel e lavem as mãos com frequência.

Os números da doença

Como disse o jornalista Walter Falceta, uma das lideranças da torcida Democracia Corinthiana, o Brasil se tornou “o pior lugar do mundo para se estar neste momento”. E os números não mentem: o país tem 11 milhões e 207 mil casos de Covid, um aumento de 81% de novos casos, com um total de 272.889 mortes. São Paulo lidera o número de pessoas contaminadas com 2 milhões, 164 mil casos e 63 mil e 10 mortos.
O Brasil só perde dos Estados Unidos da América em número de mortos (os EUA pós Donald Trump, o amigo do Bolsonaro tem agora 543 mil), mas já ultrapassa os americanos em porcentagem de novas mortes diárias ( 1.610 deles contra as 2.207 nossas).
O Brasil está ao Deus dará.

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