O companheiro Roberto Requião

Por Simão Zygband

 

Em 1990, fui ao Paraná fazer a campanha vitoriosa para governador, no horário eleitoral, de Roberto Requião, então no PMDB.

Tinha eu pouco mais de 30 anos de idade. Fui convidado por um paranaense, o jornalista Raul Varassin, que depois de memorável passagem pelo jornalismo televisivo em quatro estados brasileiros, inclusive na TV Globo, foi designado como um dos coordenadores da campanha do Requião.

Era meio novato nesta coisa de campanha e não tinha muita malícia com a política. Apenas gostava de acompanhá-la e tinha feito duas apenas como produtor, sem muita influência no conteúdo: José Serra, para prefeito de São Paulo em 1988 e do emergente Luiz Inácio Lula da Silva para presidente, em 1989, pela TVT, inesquecível, mas que acabou vencida por Fernando Collor de Mello, candidato do direitista PRN.

Mas na do Requião foi diferente. Cheguei de São Paulo como indicado por um dos coordenadores, o Varassin, que tinha sido meu chefe em vários veículos de imprensa e com quem aprendi muito. Junto com ele dividiam a coordenação os jornalistas Fábio Campana e Benedito Pires, homens de confiança do candidato.

Requião iria suceder um governador também do PMDB, o Álvaro Dias, que já naquela época não era lá muito querido pela população. A coordenação fez questão de evitar a presença dele no horário eleitoral, pois ele de fato tirava votos de um candidato vigoroso e progressista como era o Roberto.

Posso testemunhar como Requião era um candidato corajoso, que não corria da raia, e avalizava materiais polêmicos que iam ao ar. Com ele só tinha papo reto, não era um candidato vaselina, cheio de dedos para colocar denúncias no horário eleitoral.

O adversário do Requião era José Carlos Martinez, dono de uma rede de televisão e candidato do Collor. Um homem poderoso, difícil de ser batido, sobretudo em um estado conservador como o Paraná, não por acaso terra do juiz fraudulento Sérgio Moro e onde o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva teve o desprazer de ficar 580 dias presos em uma cela da Polícia Federal.

Não era fácil emplacar no eleitorado paranaense um discurso tão progressista como era o do Requião, mas ele não recuava e demonstrou naquela oportunidade toda a sua valentia e preparo para se fazer entender com uma linguagem palatável e acessível ao povão.

Assis Chateaubriand

Mas as coisas não eram tão fáceis. Apesar de todo empenho da equipe, ao terminar o primeiro turno, Requião ficou 20 pontos atrás de seu adversário Martinez. Era uma eleição já dada como perdida. O clima no comitê de campanha era de derrota. Todos os puxa-sacos e bajuladores de ocasião sumiram e bandearam para o outro lado. O dinheiro também parecia ter desaparecido, bem diferente do clima do primeiro turno, onde até hotel luxuoso quiseram pagar para mim (e eu não aceitei). Tínhamos somente 15 dias para reverter o quadro que parecia irreversível, ou seja, teria que tirar do adversário mais de 1% ao dia.

Sobrou a equipe mais fiel e mais próximas de Requião realizar o “milagre”. O pessoal do Álvaro Dias foi o primeiro que bandeou (mudou de lado). Justamente um pessoal mais à esquerda é que sabia da necessidade de derrotar a direita collorida no Paraná. Entre eles, o irmão do desaparecido político Flávio Molina, Geraldo, um camarada ligado ao PCdoB paranaense e que fazia parte da campanha.

Molina chegou para mim na produtora com um dossiê elaborado pela Comissão Pastoral da Terra (CPT) que mostrava os assassinatos no campo realizados inclusive pela família de José Carlos Martinez, através de jagunços contratados da Colonizadora Norte do Paraná, de propriedade de Oscar Martinez, pai do candidato.

Requião não duvidou um minuto em levar o tema para o horário eleitoral e autorizou a entrada no ar do material que produzi com familiares de vítimas da Colonizadora, na cidade de Assis Chateaubriand, onde era sediada a empresa e local em que ocorreram a maior parte dos assassinatos.

O candidato concordou em basear parte do seu programa de TV no segundo turno com denúncias sobre o assassinato no campo. Outro viés era o fracasso do programa econômico do governo Collor, a quem Martinez representava no Paraná.

O material que produzi trazia depoimentos emocionantes dos filhos de um colono assassinado. Quando foi ao ar no horário eleitoral, tive que ser retirado às pressas da cidade pois fomos perseguidos por jagunços dos fazendeiros da região, que ficavam rodeando o hotel onde estávamos hospedados.

Estas matérias, muito bem editadas  pelo pessoal da produtora, foram fundamentais para a grande virada e a vitória improvável de Requião nas eleições de 1990.  Tudo porque o candidato teve a coragem de bancar denúncias graves sobre o assassinato no campo.

Um salve ao companheiro Requião

 

Lula e Requião

 

Requião se filia ao PT

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