Segundo a ministra das Relações Institucionais, Glesi Hoffmann, o diálogo bilateral entre o republicano e o Presidente Lula avança na cúpula na Ásia, onde o Planalto foca em diversificação de mercados
A ministra das Relações Institucionais, Gleisi Hoffmann, desmontou o suposto poder de influência de Eduardo Bolsonaro – filho do ex-mandatário e lobista em Washington – sobre a administração americana.
Com um encontro confirmado entre o Presidente da República Federativa do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), e o presidente dos EUA, Donald Trump, marcado para 26 de outubro na cúpula da ASEAN, em Kuala Lumpur (Malásia), o cenário aponta para uma trégua pragmática, impulsionada pela resiliência econômica brasileira e pela química inesperada entre os líderes.
Durante participação no programa de podcast Flow, exibido na sexta-feira (24/out), a discussão, conduzida pelo apresentador Igor Coelho, expôs as fragilidades da estratégia bolsonarista nos Estados Unidos.
Questionada se Eduardo Bolsonaro teria “cacife” para moldar as ações do governo americano, Gleisi Hoffmann foi categórica: “Acho que não. Tanto que o Trump recuou. Já disse que teve uma química com o Lula, já gostou, já marcou para conversar e vai conversar dia 26”.
Essa afirmação ecoa relatos de uma ligação amigável entre os presidentes em 6 de outubro, onde Lula pediu o fim das tarifas de 50% sobre exportações brasileiras e sanções sob a Lei Magnitsky, usadas para punir autoridades como o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
O diálogo, descrito como muito bom por Trump em suas redes, sugere que o bilionário republicano prioriza interesses comerciais sobre lealdades ideológicas.
O contexto das tensões remonta a julho de 2025, quando Trump anunciou tarifas de 50% (40% adicionais aos 10% já existentes) sobre produtos brasileiros, vinculando-as à caça às bruxas contra Bolsonaro, réu por tentativa de golpe após as eleições de 2022.
A medida, a mais dura entre as aplicadas a mais de 20 nações, foi impulsionada por lobby intenso de Eduardo Bolsonaro, que se mudou para os EUA em fevereiro e visitava a Casa Branca semanalmente para pressionar por sanções.
Seu esforço incluiu audiências no Congresso americano e encontros em Mar-a-Lago, mas, como destacou Gleisi, resultou em “um monte de informação errada”:
“Tentaram vender isso fazer influenciaram no início. Trump aproveitou isso para colocar a questão das taxações. Já estava taxando o mundo inteiro e aí veio com aquele papo que aqui não tinha democracia que o Bolsonaro era um perseguido”, afirmou a petista.
Notícias recentes confirmam o impacto limitado dessa influência. Em agosto, após reações adversas na economia americana – com alta nos preços de commodities como café e carne –, Trump recuou em parte das tarifas, isentando itens como suco de laranja, aviões da Embraer e certos metais, afetando agora apenas 30% das exportações brasileiras, em setores específicos.
Paralelamente, sanções sob a Lei Magnitsky – invocada pela primeira vez contra um juiz de uma democracia como o Brasil – atingiram o ministro do SFT (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes em julho, congelando ativos nos EUA e revogando vistos de sua família, sob acusação de censura e detenções arbitrárias. Em setembro, o cerco se ampliou para a esposa do ministro, Viviane Barci de Moraes, e um instituto ligado a ele.
No entanto, o STF e o governo Lula mantiveram o curso: Bolsonaro foi condenado a 27 anos em setembro por seu papel no 8 de janeiro de 2023, e o Judiciário brasileiro repudiou as interferências como ataque à soberania.
Gleisi Hoffmann enfatizou a lisura do processo judicial: “O processo judicial aqui foi correto contra o Bolsonaro. Ele pode se defender, teve o devido processo legal eh, então não foi nada feito fora do que determina a lei”.
Essa postura firme, aliada a respostas econômicas ágeis, blindou o Brasil de maiores danos.
O Planalto criou linhas de crédito para setores afetados e acelerou negociações com a Ásia, onde o continente “imenso precisa da nossa carne, precisa do nosso minério, precisa da nossa produção”, como pontuou a ministra. “É saída do Lula para a Ásia do presidente para a Ásia. Não é para brincar, não é para abrir para abrir comércio mesmo”.
Viagens de Lula à Indonésia e Malásia em outubro renderam acordos bilaterais em etanol e energias renováveis, diversificando mercados e neutralizando o impacto das tarifas remanescentes, que hoje cobrem cerca de US$ 18 bilhões em exportações.
A “sorte” de Lula, como ironizou Gleisi, transformou crise em oportunidade: “O Lula teve sorte porque o Trump resolveu brigar e ele cresceu nessa briga, que ele teve sorte. Ele soube responder corretamente”.
Em vez de ceder, o presidente brasileiro, segundo a ministra, traçou uma linha vermelha: “Nós negociamos qualquer coisa do ponto de vista comercial, mas a gente não vai negociar soberania. Nós não vamos negociar a nossa justiça e nem nosso processo político interno”.
Essa estratégia não só elevou a popularidade de Lula – com 70% dos brasileiros rejeitando as ações de Trump, segundo pesquisas – como forçou o recuo americano, evitando uma ruptura com o maior parceiro comercial da América Latina, conforme analisou o jornal inglês The Guardian.
O encontro na cúpula da ASEAN, de 26 a 28 de outubro, surge como ponto de inflexão. Coordenado pelos chanceleres Mauro Vieira e o americano, o diálogo foca em tarifas e comércio, mas analistas veem chance de alívio nas sanções Magnitsky, criticadas até por coautores da lei nos EUA como desvirtuamento.
Para Gleisi, o episódio prova a limitação de Eduardo Bolsonaro: “Eles viram que não tinha condições e o Brasil teve uma resposta muito boa a toda essa situação”.
Com o Brasil emergindo mais forte, o recuo de Trump não é apenas alívio – é vitória de uma diplomacia que prioriza soberania sobre submissão.







