Por Fernando Castilho
É difícil tentar não ser mais do mesmo, mas é inevitável que, devido aos movimentos dados nos últimos meses pelo presidente Jair Bolsonaro, os militares mais próximos a ele e parlamentares que lhe dão sustentação, que tenhamos certeza de que o golpe será tentado, embora não signifique que terá êxito. Provavelmente não terá.
O capitão é um homem despreparado e totalmente incapaz de planejar qualquer coisa, sobretudo uma ruptura institucional dessa envergadura.
Não basta querer romper com o processo eleitoral, é preciso estruturar o antes, o durante e o depois.
No último 7 de setembro, Bolsonaro, guiado somente por seu ímpeto, sem nenhum planejamento, tentou o golpe, mas teve que refugar porque o apoio com o qual ele contava não veio. Foi preciso se humilhar diante do ministro do STF, Alexandre de Moraes. Ou seja, não planejou o antes e o durante.
Imaginem planejar o depois. Imaginem ter que segurar as pontas da inflação e do preço da gasolina. Imaginem governar após um golpe sem apoio da população, da imprensa e da elite econômica e financeira que verá os investimentos no Brasil serem cortados. Nem os EUA apoiam o golpe.
Mas os meses passaram e as eleições se aproximam cada vez mais. E com elas, as manifestações insanas do capitão sugerindo a possibilidade de fraude nas urnas eletrônicas e deixando claro que não aceitará nenhum outro resultado que não sua vitória.
Ao mesmo tempo, o atual ministro da defesa põe as manguinhas pra fora ao exigir ser o representante das FFAA na Comissão de Transparência das Eleições, atribuição que constitucionalmente não compete à instituição.
O ministro do TSE, Edson Fachin reagiu rejeitando novas sugestões dos militares ao processo eleitoral, embora seja o grande responsável por essa barafunda ao incluir a caserna entre aqueles que poderiam contribuir para o aperfeiçoamento das urnas. Ora, se há 100% de segurança, se há a possibilidade de auditoria dos votos e se o hackeamento é impossível, por que pedir às FFAA uma verificação do sistema?
Já faz 6 meses que Lula e Bolsonaro mantém praticamente os mesmos índices nas pesquisas e o mesmo distanciamento. O único fato novo significativo e com algum poder de alterar esse estado de coisas é o evento de lançamento da pré-candidatura Lula/Alckmin ocorrido no sábado com sucesso tão grande que pode dar a Lula mais alguns pontinhos.
Bolsonaro é burro, mas não tanto a ponto de insistir em ficar mais 4 anos no poder pelo voto. Vai perder e até o general Heleno sabe disso.
O capitão não quer dar um golpe, somente. Ele precisa dar um golpe para continuar no poder e não ser preso. Quase todos os ministros já deixaram o governo para tentar um cargo legislativo porque sabem que podem ser presos em caso de derrota do capitão, mas todo aquele pessoal que ainda está com ele vai embarcar na aventura.
Resta saber se ele terá forças para a tentativa.
O 7 de setembro deve ter servido de lição. Muito possivelmente já haja um bom contingente de milicos a apoiá-lo, mas ainda não deve ser a maioria dos quartéis.
E é isso que pode causar um confronto extremamente perigoso. Será que Bolsonaro planejou o depois?
Vai fechar o STF e o Congresso?
Como lidar com a resistência que deverá vir?
Quais seriam as consequências do ato impensado?
Mais um monte de mortes?
Diante dessa grande ameaça, vamos fazer como muita gente fez antes do golpe contra Dilma Rousseff? Vamos duvidar e confiar nas instituições e no Estado de Direito?
É preciso que os partidos que se uniram à chapa Lula/Alckmin, os sindicatos, os movimentos sociais e a sociedade civil fortaleça o apoio ao TSE e ao STF, hoje as primeiras trincheiras da resistência contra a ameaça de ditadura que está se desenhando.
É também imprescindível uma conversa e uma costura com setores das FFAA que não fecham com Bolsonaro para tentar neutralizar qualquer movimento mais arrojado da ala golpista.
Interlocutores há para isso, como o ex-ministro da Defesa durante os governos Lula e Dilma, Nelson Jobim, o ex-ministro da Defesa durante o governo Dilma, Aldo Rebelo e o ex-ministro da Defesa durante o governo Temer, Raul Jungmann. Todos eles têm bom trânsito entre os militares.
É preciso que as forças que defendem a democracia não esperem, mas que se antecipem.
Em tempo: nossa grande imprensa, que depende da democracia para manter a liberdade de expressão, imprescidível aos jornais, embora certamente não apoie o golpe, parece não ter compreendido ainda a ameaça que está por vir. Faz ares de quem quer ostentar uma neutralidade político-partidária que só favorece sua futura destruição.
Se a ficha não cair logo, será apontada no futuro como cúmplice de mais um período sobrio e cruel de nossa história.
Imagem: Gabriela Biló/Estadão Conteúdo
Fernando Castilho é arquiteto e professor. Criador do Blog Análise e Opinião.