Raposas no galinheiro

Por Sonia Castro Lopes

Estratégias da direita para mobilizar a opinião pública tentam impedir o crescimento da candidatura do presidente Lula em 2026

Não é preciso ser especialista em segurança pública para perceber a motivação política que conduziu à chacina de 28 de outubro no Rio de Janeiro protagonizada pelo governador Cláudio Castro.

Qualquer um que possua uma visão de mundo minimamente humanista é capaz de entender que o assassinato de 121 pessoas – algumas das quais sequer tinham passagem pela polícia – não resolve o problema da violência que assola as principais cidades do país.

Castro, o capacho bolsonarista, que agora se eleva ao panteão dos heróis com 70% de aprovação da população carioca, já recebeu apoio de vários governadores de direita numa associação por eles batizada como “Consórcio da Paz”. E a opinião pública, alavancada pela mídia hegemônica, consagra essa narrativa.

O desespero desses servos do capitalismo para conseguir um candidato que represente a terceira via é tanta que políticos medíocres como Castro, Caiado, Zema, Tarcísio e outros encontram espaço para formular mais um golpe com objetivo de minimizar a popularidade do presidente Lula, favorito nas próximas eleições presidenciais.

Por meio de matérias quase sempre parciais, essa mídia corporativa endossa o pânico disseminado entre a classe média pelos crimes protagonizados por “narcoterroristas” que habitam as favelas.

Essa mesma gente que se julga elite por possuir um dois quartos na Tijuca e um Corsa na garagem financiado a perder de vista, enaltece o governador facínora, dublê de político mambembe e cantor religioso, que há poucos dias foi aplaudido de pé na igreja de seu bairro, a Barra da Tijuca, reduto dos tijucanos que se julgam classe A.

Matar negros favelados para essa gente é aceitável, não enxergam ou não querem enxergar que nos morros só vivem os gerentes da boca e os bagrinhos que eles conseguem cooptar para o crime.

Ignoram ou fingem ignorar que os peixões graúdos a quem se deve combater encontram-se nas coberturas milionárias da Zona Sul do Rio e nos escritórios da Faria Lima, em São Paulo.

Todo esse introito serviu para abordar a pauta que hoje se consagra como o filé das manchetes jornalísticas: a nomeação de Guilherme Derrite, deputado federal e ex- Secretário de Segurança de São Paulo, principal responsável pela violência exercida pela polícia paulista, para relator do PL Antifacção (Projeto de Lei 5.582/2025).

Derrite atuou como policial da Rota de onde foi expulso pelo excesso de chacinas que promoveu.

Pois bem, esse foi o elemento nomeado pelo presidente da Câmara, Hugo Motta, para ser relator do Projeto de Segurança Pública. Poucas horas após a nomeação, o relator apresentou um parecer propondo alterar e endurecer o tratamento legal para facções criminosas e milícias.

No melhor estilo Marco Rubio, o relatório propunha equiparar as condutas dessas facções a atos de terrorismo com o intuito de legitimar aqui o que está sendo feito na Venezuela pelos EEUU.

Além disso, exigia que a Polícia Federal só atuasse mediante provocação do Governador do Estado. Por razões óbvias, ele e seus cúmplices desejavam afastar da PF os financiadores de suas campanhas eleitorais, além de preservar sua turminha de investigações que poderiam afetar ou mesmo encerrar suas carreiras políticas.

O governo federal já possui um Projeto de Segurança Pública. O Ministério da Justiça e Segurança Pública (MJSP) apoiado por alguns parlamentares e pela Polícia Federal (PF) reagiu ao documento proposto por Derrite com críticas que se referiam, particularmente, à submissão da PF aos governadores dos estados, o que seria inconstitucional tendo em vista o artigo 144 que define as competências das polícias estaduais e da PF, órgão visto como pilar central para o enfrentamento das facções com atuação interestadual, por isso a garantia das atribuições da PF foi colocada pelo Governo como “inegociável”.

Mesmo após as alterações feitas pelo relator, outros pontos emergiram como questões sensíveis como, por exemplo, os estados demandarem maior protagonismo e recursos para atuar contra as facções.

O governo alegou que desviar recursos federais para fundos estaduais, sem contrapartidas ou instrumentos eficazes de desarticulação das facções, pode comprometer os resultados. Como se vê, há fortes tensões entre os três poderes e entre os entes federativos quanto a competências, financiamento e estratégias.

Leis mais duras contra o crime, como propõe o relator do PL, não acarretarão mudanças efetivas. Será preciso também investir em estrutura policial e de investigação, sistema prisional, prevenção e políticas sociais, já que o crime organizado também se alimenta de desigualdades e espaços de vulnerabilidade. Esse modelo de política de segurança pública não pode ser aprovado de forma açodada como querem os governadores de direita por razões estritamente eleitoreiras.

Após quatro alterações no relatório, Derrite, que se sentia o dono da bola, sofre visível enfraquecimento político, saindo realmente desmoralizado.

Seu passado de combate ao crime e a atuação que teve na Secretaria de Segurança de São Paulo não ajudarão a mudar essa imagem, embora expressiva parte da população aprove sua conduta.

A atitude dúbia do atual presidente da Câmara que o nomeou é outro obstáculo para o sucesso do projeto que a direita quer impor. Tanto isso é verdade que na última quarta-feira (12) Derrite foi visto jantando em Brasília com os mentores de Motta — Eduardo Cunha e Arthur Lira.

Precisa dizer mais? O evento, regado a vinhos caros e nada discreto, talvez tenha sido a forma de mandar um recado a Motta, o aprendiz de feiticeiro que tenta acender uma vela a Deus e outra ao diabo e não agrada nenhum deles.

A última cartada do “Consórcio da Paz” e de seu representante, Guilherme Derrite, foi pedir autorização a Alexandre Moraes para visitar Jair Bolsonaro.

O cadáver político insepulto já cheira mal, mas ainda assim os golpistas irão tomar-lhe a bênção, como urubus devoradores de carniça. Todos almejam o cargo máximo da República, tentam se descolar do cadáver, mas disputam a herança de seu capital eleitoral que, infelizmente, ainda é robusto.

Esses últimos fatos confirmam a estratégia de minar o crescimento da popularidade do atual presidente que, segundo pesquisas, ainda é capaz de vencer todos os concorrentes e reeleger-se.

No céu de brigadeiro em que Lula parece navegar começam a se formar as primeiras nuvens. Atitudes desesperadas de quem reconhece a força do adversário. Mas em política, como na vida, não existe previsibilidade.

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