Por Simão Zygband
Seria uma leviandade afirmar que Tiago Leifert fez carreira na Rede Globo de televisão por que seu pai, Gilberto Leifert, foi diretor de Relações com o Mercado na Globo entre 1988 e 2018, uma área ligada à parte comercial e de publicidade da emissora. Ele também foi presidente do Conar (Conselho Nacional de Autorregulamentação Publicitária, órgão responsável por fiscalizar a ética das propagandas veiculadas no Brasil.
Mas também é extremamente leviano por parte dele criminalizar a torcedora do Palmeiras, Gabriela Anelli, morta ao ser atingida no pescoço por estilhaços de uma garrafa, no sábado, antes do início da partida entre Palmeiras e Flamengo no Allianz Park. O apresentador tornou a insistir no erro. Já havia dito que a palmeirense “assumiu o risco” pelo fato de ser membro de uma torcida organizada. E, novamente, para responder as críticas do colunista da UOL, o ex-jogador Walter Casagrande Filho, demonstrou despreparo jornalístico, pois fez insinuações levianas sem ao menos conhecer os fatos e as circunstâncias em que ocorreu a tragédia.
“O fato de ela ser de [torcida] organizada é relevante, porque quem tá lá corre maior risco, e isso é ruim. Mas se é esse futebol que o Casagrande e a Milly Lacombe (dois desafetos do Tiago) querem, problema nenhum, fiquem à vontade”, disse o apresentador.
Ele insistiu no erro e se mostrou despreparado para o exercício da profissão: “Eles estavam usando camisa da organizada”, disse o filho do ex-diretor da Globo. “Não tenho nada contra usar bandeirão, tocar tambor, isso é maneiro. Pô, o cara ficar 24 horas num ônibus para viajar até a Bolívia pra ver o Palmeiras jogar é porque o cara ama muito o clube. Mas precisa invadir o espaço da torcida adversária?”.
Histórico
Tiago Leifert entrou na Rede Globo em 2006 e, dois anos depois, foi promovido a editor-chefe e apresentador do Globo Esporte de São Paulo. Foi o responsável por reformular a cobertura esportiva da emissora. Praticamente implantou a abordagem jornalística “engraçadinha” para a cobertura do futebol. Talvez seja este o seu forte. Mas é fraco na apuração da notícia.
Deveria ter a humildade de apenas reconhecer o erro, que falou bobagem sem conhecer devidamente os fatos (pediu desculpas), mas fazer um esforço para jogar luz nos lamentáveis episódios, e tentar identificar o assassino ao invés de apontar dedo para a vítima.
Tiago, um jornalista de gabinete, deveria evitar de criminalizar a torcedora morta. É direito dela pertencer a uma torcida organizada, utilizar a camiseta do clube e até da torcida. Mas nem por isso alguém tem o direito de lhe tirar a vida. Que tal se ele se empenhasse em tentar ajudar a polícia a identificar o assassino? De fato, ele acha secundário um torcedor, seja de que clube for, arremessar um objeto cortante, como uma garrafa estilhaçada, só por que do outro lado do tapume, que dividia as torcidas, existia uma torcida adversária?
O presidente da Mancha Verde, a maior torcida organizada do Palmeiras, Jorge Luis, diz que jornalista tem que apurar os fatos para poder falar e tecer opiniões: “A gente viu um Global aí falando besteira, coisa que não sabe. A Mancha já se posicionou como entidade, já soltou uma nota oficial, explicando os fatos pois a imprensa não procura saber, não procura entender, pois acha mais confortável até criminalizar a menina que morreu. Só por que ela era sócia da Mancha”.
“A Mancha não tem nada a ver com o ocorrido na rua Thomáz (uma do entorno do estádio)”, diz ele. “O portão D é dos visitantes (no caso, o Flamengo). O portão C, que é na mesma rua, onde entra o palmeirense, tem uma divisa, um tapume. E naquela entrada ficam as famílias, as mulheres, as crianças. Por que a torcida organizada fica em outro lugar, no setor do gol norte. Ela não fica ali. Se estivesse a torcida organizada, a gente iria pular o tapume e descobrir o assassino na porrada. Se a Mancha estivesse lá, tinha quebrado tudo e arrebentado quem atirou a garrafa. Esta é a verdade, certo?”
E prosseguiu: “Então não tinha a Mancha. Nós fizemos o trabalho preventivo com o Batalhão de Choque. Nosso pessoal estava todo na rua Caraíbas (em outro local distante do crime). O que aconteceu foi às 18h20. O jogo era 21h00. Não tinha concentração nossa lá. Por que na primeira garrafada, que tivesse atingido alguém, como atingiu a menina, você pode ter certeza: não era a polícia que teria pego o cara, não. Quem tinha pego era a Mancha”.
E critica Tiago Leifert: “A menina sim, era da Mancha. Só por que ela era da Mancha ela merecia morrer? Só por que ela era da Mancha estaria ali arrumando confusão? Você viu o tamanho da menina? Ela não pesava nem 50 quilos. Alguém acha que ela entraria em confusão? Aquela rua, para quem não conhece, ainda mais estes jornalistas que ficam falando merda, que nunca foram ao estádio, nunca foram ao Allianz, nem conhecem a geografia do estádio. Ali ficam apenas as famílias, as torcidas de famílias. Pelas informações que eu tenho, nem organizadas, as grandes, do Flamengo estavam lá. Mas ninguém questionou o trabalho preventivo das autoridades. Só as organizadas é que são o problema? Não tinha um policiamento de área? Esquece a Mancha. Eles querem crescer em cima da Mancha”.
Simão Zygband é jornalista profissional desde 1979. Trabalhou em TVs, rádios e jornais de São Paulo, onde foi respectivamente pauteiro, repórter e redator. Foi funcionário das TVs Bandeirantes, SBT, Gazeta, Record e dos jornais Notícias Populares, Diário Popular, Diário do Grande ABC , Diário do Comércio, entre outros. Foi coordenador de Comunicação no Sindicato dos Jornalistas de São Paulo (onde editou o Jornal Unidade) e redator do jornal Plataforma do Sindicato dos Metroviários de São Paulo. Também fez assessoria de comunicação em campanhas eleitorais e mandatos parlamentares. Trabalhou na Comunicação de Secretaria Municipal de Transporte de São Paulo. Foi diretor da Rádio e TV Educativa do Paraná e Secretário Municipal de Comunicação da prefeitura de Jacareí, São Paulo.
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