Por Jorge Antonio Barros
Por aqui viviam tranquilamente cerca de 70 mil índios tamoios, quando em janeiro de 1502 aportou nessas terras o navegador português Gonçalo Coelho, acreditando que estava na foz de um imenso rio. Na verdade era a baía, que mais tarde veio a ter o nome de Guanabara. Desse mato não saiu coelho e o local ficou a ver navios por mais dez anos, até que por aqui apareceu Fernão de Magalhães, o grande navegador português que se notabilizou por ser o primeiro a navegar ao redor do globo, uma espécie de Amir Klink do século 16.
Inebriados pelas Índias, os portugueses abandonaram a terra de pau-brasil, até descobrirem o lucro que essa madeira proporcionava. As riquezas atraíram a cobiça dos franceses, com chegada de Nicolau de Villegagnon, em 1555. A presença dos franceses logo chamou a atenção dos portugueses que voltaram com tudo. Conseguiram expulsar os franceses e, para se fixar no território, o sobrinho do governador Mem de Sá, Estácio de Sá, tratou de fundar os limites da cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro, em 1565. Foi um caso típico de nepotismo a associação entre o tio e o sobrinho para botar as mãos no Rio de Janeiro. Dois anos depois, Estácio de Sá era vítima de uma flecha perdida, disparada por indígenas aliados dos franceses. A vingança dos nativos.
Nos séculos 17 e 18, a Capitania do Rio de Janeiro tornou-se um dos maiores entrepostos de negros escravizados trazidos principalmente de Angola, na África. Quando a família Real portuguesa aqui chegou em 1808, a cidade era em sua maioria formada por negros. O vocabulário africano se misturou ao português. Quitanda, dengo, moleque e… bunda, que acabou virando preferência nacional. O Rio foi capital da colônia, do Reino Unido, do Império e da República. Em 1960, perdeu para Brasília, que ganhou também a maior concentração de malas com dólares da América Latina.
Na época do prefeito Pereira Passos, no início do século passado, o Rio passou por um banho de loja e ganhou artérias pujantes, de olho em Paris. O Rio dos anos 1910-20 era uma espécie de Paris das Américas, com a cultura e a língua francesa influenciando os trópicos. Na década de 1950, o Rio viveu seu auge, com a cidade fervendo em Copacabana, suas boates e garçoniéres (para quem não liga o nome à pessoa, eram aqueles apartamentos do tipo quitinete que serviam para encontros amorosos proibidos). Eram os anos dourados, dos brotinhos, das normalistas de pernas bonitas e dos concursos de miss. A maior concentração de servidores públicos por metro quadrado atraiu também os corruptos de plantão e suas malas cheias de verdinhas.
Na década seguinte, o Rio de Janeiro é sufocado pelo golpe militar de 1964. Seus líderes políticos, estudantis e sindicais foram presos, cassados, banidos, torturados, mortos e desaparecidos. A cidade entrou numa espécie de recesso da inteligência, apesar de resistir nas artes e no samba, sempre com muita opinião. Em 1966, o Rio sofre uma das maiores enchentes de sua história, com mais de 200 mortos. Em 1975, a cidade recebe a última punhalada do regime militar, com a fusão entre os estados do Rio e da Guanabara. Foi a maior distribuição de pobreza per capita.
Nos anos 1980, renasce a liberdade, mas também o crescimento dos índices de criminalidade. É a volta de quem partiu num rabo de foguete. Em 1984, o governador Brizola cria o Sambódromo, palco da maior festa popular brasileira – o desfile das escolas de samba — que há dois anos entrou em recesso por causa da pandemia de Covid-19. Foi também nessa década que o Rio viveu uma epidemia silenciosa de cocaína distribuída pelos morros cariocas, os mesmos que serviram de berço para o samba. Na década de 1990, cai a máscara do jogo do bicho e a Lista de Castor comprova as corruptas relações entre contravenção, política, polícia e carnaval.
Mais recentemente, em 2014, vem à tona uma sucessão de escândalos de corrupção, que transfere para a prisão ocupantes do Palácio Guanabara. O sujeito ganhava um diploma de governador e logo depois um par de algemas. Tempos difíceis que jogaram o Rio na vala da roubalheira e da fraude. Foi suspeita até mesmo a escolha da cidade para sediar os jogos olímpicos de 2016. Agora, o Rio luta como pode para juntar os cacos que sobraram de sua dignidade.
Jorge Antonio Barros é jornalista e editor da página Quarentena News, onde, originalmente, foi publicada essa matéria.
Obs: Os artigos aqui reproduzidos são de inteira responsabilidade dos autores.
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Excelente relato resumido da história do Rio.