Quem chora as mortes na Faixa de Gaza?

Por Adriana do Amaral

Povo abatido, história reescrita, argumentos sórdidos

Estive em terras Palestinas, chamadas Cisjordânia, há cerca de um ano e meio. Queria ficar mais, mas o acesso é dificultado ao turista assim como as informações contraditórias. Comprei iguarias, andei de camelo, visitei a cooperativa de artesãos e comi a melhor comida que já degustei em toda a minha vida, servida com fartura e sabor incomum durante toda a viagem pela Terra Santa.

Andando pelo lugar percebemos a pobreza e um certo clima de guerra civil. Impossível não se assustar com os muros e a guarda armada que anuncia o limite dos territórios. Também, como essa terra tem sido invadida.

Um certo caos nas ruas sinaliza a pobreza e a luta pela sobrevivência, apesar de mantido o tradicional jeito árabe no comércio. Remeteu aos ambulantes brasileiros no centro histórico de São Paulo. Surpreendeu a generosidade da família que nos serviu, inclusive oferecendo água, uma raridade no local, enquanto em Israel tínhamos de comprar para dessedentarmos.

Observar a diferença de discursos entre as guias judia (incrivelmente uma brasileira radicada no Estado de Israel) e a palestina foi ativar os dois lados de cérebro. Ou seja, identificar como a informação difere entre o que é noticiado e/ou oculto na mídia hegemônica, as visões distintas ou deturpadas, os estereótipos perpetuados.

Foram poucas horas, em dois dias diferentes, encurtadas pela longa distância. No vilarejo, caminhei tranquila pelos quintais, cantarolando versos tal Marisa Monte:

Por cima das casas, cal: frutos em qualquer quintal; peitos fartos, filhos fortes; sonho semeando o mundo real. Toda gente cabe lá. Palestina, Shangri-lá…

Queria ter dormido e acordado lá, sorvido um pouco mais da cultura e realidade local. Quem dera ter pernoitado no hotel Walled-Off, do artista #Bansky. Disseram que não é fácil conseguir uma reserva na região, por absoluta falta de leitos para a demanda.

A nossa guia nos chamava de “família brasileira”. Ela contou-nos o que pode sobre a dura vida na região, principalmente das famílias católicas que, segundo ela, correm o risco de extinção e em consequência dos conflitos políticos, raciais e religiosos. Por absoluta falta de perspectivas, os mais jovens estão migrando. E, isso, cinco meses antes do início da #pandemia da #Covid-19.

A Palestina, seu cenário de guerra, seus grafites e suas gente não saem da minha memória. Lembranças aguçadas agora, que vemos o massacre em curso.

Ah… é guerra histórica. Religiosa. Não tem solução, diz o discurso oficial, mas o buraco é mais embaixo.

É muito mais do que ideologia. É genocídio de um povo, de uma cultura por território, por terra, por domínio do explorador pelo explorado.

Os tratados não foram cumpridos, o Estado de Israel avança as fronteiras, os direitos das famílias palestinas na região neutra são ceifados e a morte assola gerações.

Assistir o vídeo dos bombardeios, ver as fotos e constatar o poderio da indústria bélica e o silêncio mundial frente à dor do povo palestino sangra. Isso, pelas mídias sociais, pois pouco se fala a respeito na mídia tradicional. A dor do povo que resiste à fome, se expõe ao #coronavírus, sem vacina, não tem como evitar a morte eminente de uma guerra econômica.

O pai, ao descobrir que perdeu quatro filhos de uma só vez, cujas vidas foram ceifadas por um míssil que veio do céu, grita, e chora:

Onde eles estão? Eles eram quatro! Não, meu Deus, me ajude”.

Nos últimos dias, cinco prédios foram bombardeados na Faixa de Gaza. O poderia dos mísseis é tal, que um prédio comercial de 12 andares foi ao chão em segundos. Um assentamento de refugiados também foi bombardeado.

Oficialmente, até sábado (15), em cinco dias de bombardeiros, foram feridas 950 pessoas e 140 civis mortos. Trinta e nove crianças abatidas mostram que a guerra tem lado: dos poderosos. Um número que só cresce.

Neste sábado (15), um multidão de jordanianos começaram a marchar rumo à Faixa de Gaza. Aos poucos, os protestos pró-Palestina acontecem na Europa e pontos isolados no mundo. No Brasil, a solidariedade vem dos mais pobres.

Lembro-me de dois jovens palestinos protestando isolados pela independência do Estado da Palestina, vigiado por guardas judeus. Lembro-me das bandeiras da Palestina relembrando, em manifestações, que há um povo que:

Lá o tempo espera
Lá é primavera
Portas e janelas ficam sempre abertas
Pra sorte entrar
Em todas as mesas, pão
Flores enfeitando
Os caminhos, os vestidos, os destinos
E essa canção.

2011. Tempos medievais.

#GazaUnderAttack #palestinewillbefree

Com dor no coração, e esperança, espero que esta canção chegue ao povo palestino:

 

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