Construir Resistência
Imagens: reprodução

Quando a ficção é real

Por Beatriz Herkenhoff

O que eles têm em comum?

Três filmes impactantes, sendo dois baseados em histórias reais. Produções cujo protagonistas viveram experiências de limitações físicas, em áreas diferentes. Respectivamente: artrite reumatóide, esclerose múltipla e perda de audição.

Eles têm uma força interior que permitiu que não desistissem de lutar. São exemplo de garra, determinação e resiliência no enfrentamento dos desafios impostos pela realidade.

Quando terminamos de assistir essas películas nos perguntamos: como reagimos ao longo de nossa vida a doenças e outras limitações que nos paralisam? Que recursos construímos para seguir em frente?

Maudie (2016, coprodução Irlanda e Canadá), nos transporta para o cotidiano da artista canadense Maud Lewis (1903-1970). Uma história que nos envolve, comove, emociona e sensibiliza.

Artista popular talentosa, Maudie tem artrite reumatoide e, por isso enfrenta a insensibilidade, o desprezo e o preconceito da família que a considera incapaz. Ela decide romper com os familiares e trabalhar como empregada doméstica para um rude vendedor de peixes. Passa a morar numa pequena casa situada num lugar isolado e inóspito. Mas, não se deixa abater pelas dores degenerativas, transfere sua energia, vitalidade e criatividade para a produção de lindas e delicadas pinturas.

As paredes de sua casa são transformadas pela combinação de cores que geram beleza e harmonia. Uma história densa e surpreendente. Após o filme, vale a pena pesquisar e conhecer as belíssimas e delicadas obras de #MaudLewis.

100 metros (2016, coprodução luso espanhola) conta a história de um executivo de uma empresa de publicidade. Ramón tem esclerose múltipla e a doença o está deteriorando rapidamente.

Ao ser comunicado que em pouco tempo não poderá andar nem 100 metros, apesar da raiva e da negação inicial, não se deixa abater. Decide estabelecer como meta disputar uma prova do Ironman (3,8 metros nadando, 180 km de ciclismo e 42 km de corrida).

Uma história comovente,. De garra, amor familiar e superação. Aborda as dificuldades de se encarar a esclerose múltipla, mostrando a luta de Ramon e daqueles que o amam (esposa, sogro, filhos). Conflitos e sentimentos contraditórios vêm à tona, como: raiva, negação, impotência, tristeza, esperança, culpa, acusações, confiança, fraqueza, desânimo, vontade de desistir, persistência, determinação, entre outros. Diálogos fortes intercalados com momentos engraçados, o que suaviza a densidade do drama.

 

O som do silêncio (2019, produção Estados Unidos) retrata a perda da audição sofrida pelo baterista de heavy metal, Ruben. As mudanças repentinas em sua vida e a busca de tratamento em uma comunidade de pessoas com deficiência auditiva. Nesse espaço terá que aprender a lidar com a surdez.

Uma das riquezas do filme é que o tratamento irá conduzi-lo para a descoberta do verdadeiro sentido da vida. Uma oportunidade para mergulhar no silêncio do seu EU. O foco está na busca da cura psíquica e emocional. Única forma de enfrentar as derrotas que a vida impõe.

Além de aprender a se comunicar através da linguagem de sinais, é necessário lidar com os sentimentos de medo, raiva, angústia, desespero, confusão, negação, frustração, tristeza, solidão tão presentes em experiências de perdas. O tratamento estimula o autoconhecimento e a autoaceitação. A força da comunidade também aparece como elemento essencial.

Esse filme envolve atores com deficiências auditivas, dando visibilidade a questão dessa deficiência que gera tantos preconceitos e estereótipos na vida real. Ao final, ficam muitos questionamentos, como: que desconfortos o silêncio gera em mim? Por que fugimos dos barulhos que inquietam nossa alma através do excesso de atividades e tarefas? Como estamos cuidando de nossa saúde mental?

Ressalto que o ator foi internado numa clínica de reabilitação de dependentes químicos surdos.  O que lhe garantiu não apenas a convivência com #pessoascomdeficiênciaauditiva, mas a complexidade da pessoa surda dependente química.

No filme Maudie, por outro lado, somos convidados a refletir também sobre como transformamos (embelezamos) o lugar onde moramos nesse período de isolamento imposto pela #pandemia.

Beatriz Herkenhoff é doutora em serviço social pela PUC São Paulo. Professora aposentada da Universidade Federal do Espírito Santo. Cinéfila.

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