Por Alfredo Herkenhoff
Se Lula fracassar, morrer, for morto, sofrer acidente ou terminar o mandato sem gerar empregos nem bem-estar, o que virá será o fechamento completo do oligopólio midiático das empresas corporativas decadentes. Será o fechamento do Congresso. Será a ucranização total. Viraremos um Grande Haiti

Lava-jato, invasão do Iraque, revolução Maidan, ou golpe de Estado na Ucrânia, bombardeio da Otan sobre a Líbia, tudo isso só foi possível por causa da propaganda.
A palavra no título desta reflexão vem do Latim, do verbo propagare, ou espalhar, semear, gerar reproduções, repetições…
A palavra hoje é um vocábulo internacional, não tem e não precisa de tradução em 99% dos países da terra.
A propaganda enquanto palavra ganhou status de arma política uns 300 anos atrás, via ingleses adotando o termo do Vaticano com tantas obras missionárias para espalhar a fé pelo mundo.
Mas, considerando a bibliografia, ou a historiografia das guerras ao longo de séculos e civilizações, o conceito de propaganda como uma arma na luta está evidente desde sempre. Desde o tempo do manual chinês A Arte da Guerra, opúsculo de uns 2 mil anos antes de Cristo, está claro que a informação que se divulga e que se esconde é fundamental para as chances de um exército derrotar um outro exército.
Há um dito popular que se perde no tempo e que, salvo engano, não tem autoria reconhecida, mas que diz mais ou menos o seguinte: em tempos de guerra, a mentira é como terra. Ou seja, é vasta, é farta.
Uma conhecida minha que era do teatro me disse numa ocasião que Bertold Brecht teria dito ou escrito que a propaganda é o altar do inferno. Nunca chequei se procede a citação. Mas se non é vero, è bem trovatto.
A propaganda espalha a informação que pode ser uma mentira disfarçada de verdade e pode ser uma verdade na qual pouca gente crê porque a propaganda anterior levou aquele público a ter certeza de que esta verdade é propaganda dos mentirosos.
Dilma foi deposta por causa da propaganda. Lula foi preso por causa da propaganda. O STF por 6 a 5 autorizou Moro a prender Lula sem provas e ao arrepio do inciso 57 da Artigo Quinto por causa da propaganda que dizia que quem fosse contra estava a favor da corrupção.
Aquela frase famosa de Goebbels, a mentira mil vezes repetida vira verdade, não era novidade. Era só propaganda sobre como melhor fazer propaganda nazista.
A palavra de ordem dos revolucionários russos sob Lenin era “Agit e Prop”. Ou agitação e propaganda. Agitação era o termo da época para militância política.
Com o advento da era digital, o conceito milenar ganhou propulsão numa escala nunca vista através dos celulares, das ferramentas sociais e dos algoritmos, que são uma técnica de turbinar a velocidade da repetição da propaganda.
E no cenário contemporâneo, bombas em Belgrado, bombas na Síria, primaveras árabes, revoluções coloridas, direitos humanos, guerra às drogas, guerra ao terror, Estado mínimo, o inferno são os outros, esquerdalhada corrupta, a culpa é dos migrantes que tentam chegar à Europa, não dos que plantam bombas e colhem refugiados, enfim, neste ambiente, existe alguma alternativa para você não sucumbir aos poderosos que controlam a emissão mais maciça de propaganda?
Sim e não. Rola uma contradição. A propaganda dos donos do dinheiro, do capitalismo da financeirização que se firmou pós autodissolução da União Soviética, enfim… a propaganda da classe dominante deixou de pregar golpes de Estado com base em fuzis e tanques. A propaganda passou a buscar corações e mentes. Passou a buscar a alienação, a lavagem cerebral mediante emoções. Passou a demonizar não apenas os comunistas, os social-democratas, os trabalhistas, os cristãos franciscanos, passou a demonizar, além dos políticos progressistas, a própria politica como um todo. Todo mundo que for contra a propaganda neoliberal é a favor da corrupção.
Isso produziu um curto circuito entre os que, torpedeados pela propaganda da financeirização selvagem, passaram a odiar não apenas pessoas progressistas, mas pessoas conservadoras não radicais nessa loucura de cancelamento de qualquer debate racional.
Por causa dessa metodologia de condenar o adversário político, o diferente, a propaganda na era digital passou a condenar também os divergentes dentro do campo dos que condenavam os políticos e as políticas progressistas.
No caso do Brasil, os extremistas que se deram bem com a propaganda que tirou Lula e Dilma passaram a chamar de bandidos, corruptos, pedófilos e comunistas todos os aliados que divergiram deles, como Dória, TV Globo, Gilmar, Frota, Tebet, Xandão, Alckmin, Fachin, Carmen Lucia etc etc etc.
Esse fenômeno se repete mundo afora. A técnica digital que lacra, que insulta e jamais aceita debate civilizado, condenou todas as versões de comunicação de países que estavam no alvo. Por causa disso, europeus têm certeza de que os russos são o mal, que Putin invadiu porque acordou querendo invadir, enfim, houve uma desmoralização das versões contrárias.
Mas, no campo vencedor do neoliberalismo suicida da financeirização total, a propaganda digital causou a destruição também da velha capacidade quase monopolista da velha grande mídia . Isso está produzindo um problema novo. A classe dominante que controla o velho mainstream midiático está sentido pela primeira vez que o ódio propagado pela propaganda é perigoso também para os golpistas neoliberais da financeirização.
No caso do Brasil é simples: se Lula fracassar, morrer, for morto, sofrer acidente ou terminar o mandato sem gerar empregos nem bem-estar, o que virá será o fechamento completo do oligopólio midiático das empresas corporativas decadentes. Será o fechamento do Congresso. Será a ucranização total. Viraremos um Grande Haiti. Em vez de felicidade e vida digna, o bolsonarismo vai distribuir tontons-macoute pra todo mundo.
