Dos 63 parlamentares presentes à sessão, 25 votaram contra a proposta que reafirma princípios já garantidos na Constituição Federal de 1988
Sonia Castro Lopes
Na última quarta feira (21) foi votado na Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro – ALERJ – um projeto que garante liberdade de opinião no ambiente escolar. Na verdade, o projeto de lei (PL) 4496/2018, de autoria dos deputados Carlos Minc (PSB) e Andre Ceciliano (PT), reitera princípios constitucionais em relação à livre expressão de idéias nas escolas. O placar apertado causou espanto: 37 votos favoráveis, 25 contrários e uma abstenção. Os que se opuseram à proposta qualificaram o projeto como uma “aberração”, o que demonstra falta de conhecimento da lei máxima do país e total alinhamento aos interesses do governo federal.
O projeto veio à pauta pela segunda vez, pois já havia sido votado anteriormente e recebido emendas. Volta agora para que essas emendas sejam discutidas. O relator da CCJ – Comissão de Constituição e Justiça da Alerj – deputado Marcio Pacheco (PSC), um conservador moderado, afirma que defendeu a constitucionalidade do texto, embora tenha sido criticado pelos radicais que apóiam a ‘escola sem partido’ uma das pautas prioritárias dos bolsonaristas na área educacional.
O relator da CCJ fez uma seleção das emendas cabíveis sempre tendo como foco a Constituição Federal e, após acordo com os autores do projeto elaborou um substitutivo, ou seja, um texto acrescido das emendas selecionadas. O substitutivo foi aprovado, mas os autores das emendas não acolhidas pela CCJ apresentaram os chamados ‘destaques’ – emendas que não foram aceitas pela CCJ e que serão votadas em separado. Se aprovadas, na semana que vem, serão incorporadas ao texto, que pode mudar completamente.
O projeto garante a liberdade de expressão nas escolas. Professores só poderão ser filmados mediante autorização expressa dos mesmos e todos os sujeitos – alunos, docentes e funcionários – das escolas sediadas no Rio de Janeiro serão livres para expressar seus pensamentos e opiniões. O texto também proíbe que opiniões sejam cerceadas mediante violência ou ameaça, que haja manifestações com calúnia, difamação e injúria, além de qualquer violação aos princípios constitucionais e normas que regem a educação nacional. Garante-se, ainda, liberdade para os grêmios estudantis promoverem debates nas escolas públicas estaduais, desde que sejam divulgados e abertos a todos os membros da comunidade escolar a fim de garantir pluralidade de idéias e concepções. Apesar de defender a garantia dos direitos acima mencionados, o substitutivo inclui a proibição de atividades político-partidárias em repartições públicas, medida já prevista em lei.
De acordo com os autores do projeto “nos tempos atuais, em que escolas e professores têm sido acusados de partidarização e interferência em assuntos que deveriam ser restritos às famílias, não se podem confundir a defesa da liberdade e o pluralismo das idéias e concepções pedagógicas, princípios constitucionais que regem o ensino no Brasil, com a visão de que, em nome da liberdade, tudo é permitido. A defesa das liberdades de expressão e concepções pedagógicas, evidentemente, não significa estar livre para disseminar preconceitos e intimidar professores.”
A votação não terminou, pois a apreciação dos ‘destaques’ ocorrerá na próxima semana. Dentre os mais bizarros, sobressai a modificativa n. 18 que pretende alterar o artigo 4º da lei ao preconizar que os estudantes têm o direito de gravar as aulas “a fim de permitir melhor absorção do conteúdo ministrado e de viabilizar o direito dos pais ou responsáveis de ter ciência do processo pedagógico e avaliar a qualidade dos serviços prestados pela escola.”
Convém ressaltar também a modificativa n. 10 de autoria da deputada Alana Passos (PSL) ao argumentar que o Poder Público “não deve se imiscuir na orientação sexual dos alunos nem permitirá qualquer prática capaz de comprometer ou direcionar o natural desenvolvimento de sua personalidade, em harmonia com a respectiva identidade biológica de sexo, sendo vedada a aplicação dos postulados da ‘ideologia de gênero.’”
Percebe-se claramente que os defensores de tais ‘destaques’ são deputados vinculados ao projeto da ‘escola sem partido’, dentre eles Charlles Batista (Republicanos), Rodrigo Amorim, Marcio Gualberto e Charlles Batista, estes filiados ao PSL. Representam, em sua maioria, segmentos que pregam o ensino religioso e princípios morais defendidos pelas famílias, pautas tradicionais alinhadas ao setor evangélico.
Mesmo após as derrotas sofridas no STF, o movimento ‘escola sem partido’ ainda faz barulho. Parece que a ‘guerra cultural’ travada por segmentos reacionários e movida pela retórica do ódio continua a agir no campo educacional. Os autores do projeto “Escola sem mordaça” estão otimistas e só nos resta torcer para que esses ‘destaques’ não sejam aprovados e incorporados ao texto do projeto, o que terminaria por descaracterizá-lo completamente. É necessário combater a ‘guerra cultural’ movida por parlamentares de extrema direita que almejam o retrocesso da educação no país. Depois de aprovada, inicia-se uma nova batalha: a proposta segue para apreciação do governador em exercício Claudio Castro, que pode sancionar ou vetar o texto.