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PMs voltam cobertos de sangue após chacinar presos no Carandiru

Por Luiz Galvão

 

Massacre vai completar 29 anos sem que nenhum policial tenha sido punido

 

No dia 2 de outubro próximo o massacre do Carandiru vai completar 29 anos. Presenciei, como repórter da TV Record, uma cena que não vou esquecer jamais. Estava na cobertura desta trágica ocorrência e juntamente com um experiente colega vi quando os policiais do GATE  retornaram a um anexo da Casa de Detenção minutos após terem realizado a chacina, que teve como saldo 111 mortos.

O que sei é que todos os envolvidos estão soltos, não receberam nenhuma punição, pois certamente tiveram seus julgamentos “facilitados”. Mas os policiais carregam o peso de terem executado friamente 111 presos, que estavam sob a custódia do Estado. Um dos mais graves incidentes envolvendo rebeliões e mortandade na história de todos os presídios do mundo.

Não vou nominar os policiais envolvidos pois ainda hoje temo represálias. Mas, basta dar uma pesquisada no Google para ver como a Justiça permitiu o massacre de presos no Carandiru, sem que nenhum dos envolvidos tenha sido punido. Sou testemunha de que houve sim um massacre.

Vi pessoalmente o comandante do GATE e os soldados sob seu comando totalmente ensanguentados, momentos após terem realizado uma das maiores chacinas em presídios que se tem notícia. Tinham sangue dos presos nas botas, fardas, nos rostos, nas metralhadoras e fuzis.

Foi um total e inesperado flagrante que dei durante minha cobertura para a TV Record dessa carnificina cometida pelo Batalhão de Choque da PM paulista. Infelizmente, não foi possível registrar essa cena porque o repórter cinematográfico que estava comigo na cobertura, Décio Ciappini, tinha ficado à postos na entrada principal da Casa de Detenção. 

Cheguei para fazer a cobertura por volta das 15 horas daquele outubro de 1992. E me postei na entrada do presídio, junto com os demais colegas das outras emissoras. O que presenciei aconteceu cerca de uma hora depois de 300 policiais militares invadirem a Casa de Detenção, o chamado Carandiru. E eu não estava sozinho.  Um colega, experiente jornalista de polícia e justiça de um importante jornal impresso, me chamou de lado para acompanhá-lo até um anexo do Carandiru,  que ficava do lado direito da entrada principal do complexo, a cerca de 50 metros de distância. 

Quando chegamos, não havia ninguém lá, mas apenas por alguns minutos. Logo vimos e ouvimos os soldados chegando do Pavilhão Nove, onde aconteceu o massacre. Estavam como que possuídos, endemoniados, cobertos pelo sangue das vítimas. Na farda, no rosto, nas armas. Eles nos viram. Fiquei estarrecido.  

Ainda não sabíamos o que havia acontecido, mas percebi então que éramos testemunhas de algo muito maior do que supúnhamos, do que iria se tornar o maior massacre de presos da história do país.

Meu colega, mais rápido do que nunca, disse “vamos sair já daqui, corre. Vai sobrar para nós”. Saímos correndo, ouvindo os gritos de raiva, palavrões e ameaças daqueles PMs. 

Concordamos em não contar para ninguém o que havíamos visto, pois para isso precisaria de provas. Naquele momento, era difícil ter certeza de alguma coisa. Senti medo de represálias, vingança. Passei a fazer a cobertura para a TV diariamente sobre o massacre.

Na CPI do Carandiru, ficou comprovado que os presos não possuíam armas de fogo, como alegavam os policiais. Foram assassinados a sangue frio.

O ex-capitão da PM e ex comandante do GATE afirmou em vários depoimentos à Justiça que ele e seu grupo de soldados não participaram da carnificina. Que apenas deram “um ou dois tiros para o alto, tiros de advertência”.  Já os peritos criminais, enfatizaram que foram encontradas várias marcas de disparos dentro das celas e que caracterizariam tiros feitos em rajadas, ou seja, utilizando metralhadoras.

O Massacre do Carandiru ocorreu no dia 2 de outubro de 1992. Oficialmente foram 111 motes. Número contestado até hoje pelos órgãos de direitos humanos. Os policiais envolvidos, alguns ainda continuam na ativa. Ninguém sabe como dormem tendo nas costas tamanha chacina.

 

 

Edição: Simão Zygband

 

Luiz Galvão é jornalista profissional, com pós-graduação em mídias sociais. Já foi repórter, editor e chefe de reportagem nos principais telejornais das emissoras de TV de São Paulo

 

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