Perdemos um gênio capaz de desenhar o som

Por Gilberto Maringoni 

Foi-se nesta madrugada Elifas Andreato, aos 76. Ninguém pode escrever a história dos anos de chumbo sem destacar esse paranaense de Rolândia que aqui chegou na segunda metade dos anos 1960 para fugir da pobreza. Elifas começou sua carreira na editora Abril, depois de vagar por pensões e empregos de operário na periferia da capital paulista.

Elifas desenhou generosamente para quase toda a imprensa alternativa, enquanto fazia capas de revistas e discos com apuro e estilo personalíssimos. A primeira página do jornal ‘Unidade’ (Sindicato dos Jornalistas de SP), de dezembro de 1975, denunciando o assassinato de Vladimir Herzog é tão marcante que virou símbolo do prêmio de Direitos Humanos mais importante do país.

Mas foi na programação visual de discos e de cenários para teatro e TV que Elifas exibiu as melhores facetas de seu talento. Não é exagero dizer que foi parceiro de Chico Buarque, Martinho da Vila, Vinícius de Moraes, Paulinho da Viola, Cartola, Noel Rosa e gente da mesma estirpe. As artes gráficas dos elepês – algo lamentavelmente tornado obsoleto pelo streaming – estavam tão entrelaçadas às músicas, que não é exagero dizer que Elifas foi um dos poucos desenhistas capazes de transformar lápis e pincel em instrumentos musicais.

Morreu pobre, como no início de tudo. Quase não se veem mais trabalhos seus circulando por aí. A característica radicalmente libertária de toda a obra de Elifas se renova diante da estupidez fascista dos dias atuais.

 

Painel de 5 metros de Elifas que foi retirado pela direita no Congresso Nacional

Quadro doado por Elifas ao Sindicato dos Jornalistas em memória à morte de Wladimir Herzog

 

Estátua de Elifas realizada em memória de Wladimir Herzog (na foto com a família do jornalista)

Capa de disco do Elifas

Capa de disco do Elifas

Gilberto Maringoni é jornalista, chargista, ilustrador

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