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O exército do capitão

Por Sonia Castro Lopes

Engana-se quem pensa que o capitão reformado teria apoio somente dos militares de baixa patente e das forças policiais estaduais que acolhem em suas tropas uma multidão de milicianos. O que assistimos ontem foi suficiente para acreditarmos que um novo golpe está em curso.

Bolsonaro sente-se acuado e, como um cão raivoso, quanto mais atacado mais perigoso fica. Perdeu prestígio junto à classe média, em parte devido à saída de Sérgio Moro de seu staff governamental, em parte devido a sua política  negacionista frente à pandemia. As camadas sociais mais empobrecidas que o apoiavam e mantinham-se satisfeitas com o auxílio emergencial de R$600 que ele alardeava ter partido dele – ocultando o protagonismo dos parlamentares opositores ao seu governo – deixaram de apoiá-lo diante da miséria e do desemprego que enfrentam. Lula livre das acusações por decisão do STF cresce nas pesquisas, a CPI da pandemia avança. Isso apavora o capitão.

No fundo ele sabe que a aliança com o centrão pode ser efêmera. Não há lealdade naquele grupo. A elite representada pelo empresariado nacional desconfia que as reformas que tanto deseja não sairão do papel e a posição do ministro Paulo Guedes segue cada vez mais enfraquecida. Caso, de fato, não avancem as grandes reformas econômicas e a política de privatização que lhes foi prometida, o governo também perderá o apoio dessa classe.

O que lhe resta? Contar com o apoio das Forças Armadas. Não por acaso os militares foram tão beneficiados em seu governo. Passaram incólumes pela reforma da previdência, alcançaram postos comissionados, tiveram seus soldos majorados. Bolsonaro tem governado para os militares, assim como nos 28 anos em que ocupou uma cadeira na Câmara Federal, sempre contando com os votos dos militares e o de suas pensionistas, especialmente de suas filhas.

A multidão nas ruas assustou Bolsonaro. E fez com que os militares se curvassem às suas ordens, atemorizados com o avanço da “esquerda”, majoritária nas manifestações do último 29 de maio. O panelaço ouvido nas grandes cidades na quarta feira (2) confirmando o resultado das últimas pesquisas de opinião sobre o desempenho de possíveis candidatos nas próximas eleições também contribuiu para o desfecho da crise institucional que se desenhava. Tudo levava a crer que o ex-ministro Pazuello fosse punido, ainda que de forma branda, ou fosse encaminhado para a reserva. Não foi o que aconteceu. Não só o processo foi arquivado por decisão do alto-comando do exército como Pazuello ainda foi agraciado com um cargo de assessoria no Planalto que vai aumentar seus rendimentos em quase R$17 mil.

O capitão não só retirou do caminho os militares que se negaram a se curvar ao seu autoritarismo como os generais Santos Cruz, Rego Barros, Fernando Azevedo e Silva e Edson Pujol como nomeou para ministro da Defesa o general   Braga Neto que, assim como Pazuello, sobe em palanques para chancelar as idiotices proferidas pelo capitão. O comandante do exército, general Paulo Sérgio Nogueira, foi cooptado de forma rasteira: ou livrava Pazuello da punição ou perdia seu cargo.  Vemos hoje as forças armadas seduzidas pelo poder e pela força do dinheiro. Venderam-se ao fascismo. Existem generais da reserva que faturam de salário algo acima de R$60 mil enquanto servidores civis qualificadíssimos como, por exemplo, os professores/pesquisadores das universidades federais que não chegam a receber 1/3 desses vencimentos.

E a imprensa? O que dizem vocês da imprensa capitaneada por empresários que controlam a mídia hegemônica? Não se iludam, são antibolsonaristas até a página dois. Vejam como negaram a primeira página de domingo às grandes manifestações ocorridas em todo o país (exceção feita à Folha de São Paulo). Esperem os ventos mudarem de direção para ver como mudam de discurso.

O Exército brasileiro, inclusive a alta oficialidade, acabou se curvando ao  capitão genocida. Com certeza, o exército está dividido, mas não a ponto de vir a público fazer uma declaração contra o presidente. Os militares de baixa patente, assim como as forças policiais e milicianos são bolsonaristas desde a primeira hora. Alguém ainda tem dúvida que temos um golpe em curso? O exército brasileiro que hoje envergonha a nação rendeu-se ao capitão insubordinado que deveria ter sido expulso nos anos 1980 quando liderou um movimento contra sua própria instituição. Bolsonaro, de fato, tem um exército pra chamar de seu.

 

Imagem: Marcos Corrêa /PR

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