Por Sonia Castro Lopes
O povo anda cansado. Cansado de tanta ignorância, de tanta miséria, de tanta impunidade. Cansado dessa pandemia que já levou quase 600 mil brasileiros. O povo está mais pobre, sem emprego, sem dinheiro para o aluguel, para se alimentar, para se locomover. A população de rua aumenta assustadoramente. As madames do Leblon se incomodam com os “pedintes” que, segundo elas, preferem mendigar a trabalhar.
“ (…) Olha, a caixa do Zona Sul (supermercado) me disse que já foi oferecido trabalho a muitos desses moradores de rua, mas eles preferem ficar por aí, vivendo da caridade do que trabalhar.” “ (…) nunca vi tanta miséria, na Barra da Tijuca onde morei por 30 anos e criei meus filhos isso não existia. Morávamos num condomínio fechado que tinha de tudo.”
O que dizer a uma pessoa dessas? Nada, absolutamente nada. Não consigo mais lidar com esse tipo de gente. A grande maioria elegeu o capitão criminoso direta ou indiretamente por não enxergar “outra opção”. Tudo, menos o PT! Alguns repetirão o voto, com certeza; outros já decepcionados esperam ardorosamente pelo personagem que irá incorporar a terceira via tão apregoada pelos colunistas e comentaristas políticos das Organizações Globo.
No último sábado (2) houve manifestação #forabolsonaro aqui no Rio de Janeiro. Estive presente praticamente em todas elas. A de ontem me decepcionou um pouco e me levou a pensar: mudaram as passeatas ou mudei eu? Sinceramente, não sei. Dizem que o número de participantes não decresceu, mas a animação não foi a mesma dos protestos anteriores. Havia muitos estudantes, intelectuais, representantes de partidos, de minorias, alguns políticos e artistas, mas senti falta do grito, do cheiro e da alegria do povo. Esse povo que nas últimas vezes vimos chegar com a família inteira – filhos, netos, farnel – para se misturar às outras gentes, ontem quase desapareceu. Está sem dinheiro para o transporte, precisa cavar um “bico” para poder sobreviver, já não tem ânimo para protestar. De que adianta pedir o impeachment de um presidente criminoso se sabemos que isso não acontecerá?
O genocida está blindado, comprou todo mundo, sapateia na cara do povo, não se importa com a crise sanitária, com o caos econômico, desafia os princípios democráticos e nada acontece. Ou melhor, acontece. Tutelado por velhas raposas políticas e com medo de que aconteça o pior à sua prole, desmancha-se em desculpas como uma criança travessa e promete que vai se comportar melhor dali pra frente. Dizem os entendedores em política que o presidente está acabado. Será mesmo?
A equipe econômica dá tratos à bola para conseguir recursos e bancar o novo auxílio emergencial destinado aos brasileiros em situação de vulnerabilidade. Agora passará a chamar-se “Auxílio Brasil” de forma a apagar do imaginário coletivo o programa “Bolsa Família” instituído pelo governo Lula que tirou o país do mapa da fome. De onde sairá o dinheiro para sustentar esse projeto eleitoreiro?
O presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, revelou-se preocupado com a estratégia do governo federal para custear o prometido auxílio. Ele não se expressou nesses termos, mas deu a entender não ser possível contar com o ovo no fiofó da galinha. Segundo o senador, que já está sendo cotado como futuro presidenciável, é temerário apostar em recursos advindos da reforma do Imposto de Renda que ainda nem aconteceu, como deseja a equipe econômica.
Não é preciso ser adivinho para saber quem irá pagar o pato. Por que não abrir mão das emendas parlamentares, dos recursos que estão nas mãos do relator do orçamento, da taxação das grandes fortunas? Não! Preferem onerar a classe média cada vez mais empobrecida com IOF, mudanças no imposto de renda e demais reformas que prejudicam seriamente os trabalhadores e os servidores públicos civis, porque os militares estão a salvo, assim como a elite econômica que se beneficia com as políticas anti-sociais desse governo.
Se a manifestação de sábado foi um tanto decepcionante, o dia foi salvo por um episódio que marcou nossa viagem de volta no metrô. Muito educado, um rapaz aproximou-se do grupo para hipotecar solidariedade à nossa luta. Oriundo de uma pequena cidade mineira dominada politicamente por bolsonaristas, Thiago (esse é seu nome) declarou ser egresso de uma família humilde e só conseguiu se formar em engenheiro químico (com mestrado, inclusive) por ter sido beneficiado pelas ações afirmativas implementadas no governo do PT. Graças à qualificação obtida, foi contratado por uma importante indústria de cosméticos e iniciava sua carreira profissional no Rio de Janeiro.
Nesse momento senti que, apesar do desânimo, precisamos esperançar. Sim, esperançar como nos ensinou Paulo Freire, cujo centenário de nascimento foi comemorado há poucos dias. Esperançar no sentido de se levantar, correr atrás do que se deseja, não desistir nunca. Esperançar é construir. Esperançar é resistir.
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Não podemos nos desanimar nunca.