Trata-se de espetáculo assustador e deprimente. A Internet reproduz cada lance, como se fosse uma partida de futebol americano. É o julgamento, em Fairfax, na Virginia, da treta hollywoodiana entre o ator Johnny Depp, de 58 anos, e sua ex-mulher, Amber Heard, de 36 anos.
Johnny e Amber se conheceram em 2009, nas gravações do filme “Diário de um jornalista bêbado”. Começaram o relacionamento em 2011 e se casaram numa cerimônia civil em 2015.
Em 2016, ela pediu o divórcio, alegando que tinha sido vítima de abuso físico e verbal quando o marido bebia ou consumia drogas. Depp afirmou que a esposa estava tentando resolver a própria vida financeira.
Em agosto daquele ano, o casal chegou a um acordo. Johnny aceitou pagar 7 milhões de dólares a Amber, que prometeu doar o valor para duas entidades, a American Civil Liberties Union e o Children’s Hospital Los Angeles.
Em junho de 2018, Depp processou o News Group Newspapers (NGN), do Reino Unido, empresa que publica o polêmico “The Sun”. O motivo: o jornal o definiu como um “espancador de mulheres”.
Em novembro de 2020, o Supremo Tribunal de Justiça rejeitou as demandas do ator e afirmou que as agressões dele contra a mulher tinham sido provadas, de acordo com os parâmetros fixados pelo direito civil. No veredito, os magistrados salientaram ainda que o episódio havia prejudicado a carreira de Amber.
Em outro processo, Depp acusou a ex-mulher de difamá-lo em uma declaração ao jornal The Washington Post, no qual ela afirmou:
– Dois anos atrás, tornei-me uma figura pública representando o abuso doméstico e senti toda a força de nossa cultura contra as mulheres que se manifestam sobre o tema.
Em agosto de 2021, Amber contra-processou Depp, afirmando que ele havia movido uma campanha de assédio moral no Twitter e articulado esforços para apresentar uma petição para excluí-la da continuação do filme “Aquaman”, no qual ela interpreta a bela e poderosa princesa Mera.
O encontro final desse MMA jurídico opõe duas polêmicas figuras em busca de mais exposição midiática e dinheiro. Depp nega ter sido violento e exige 50 milhões de dólares como reparação pelas declarações da ex-mulher.
Há testemunhas que confirmam as reclamações de Amber e apontam para uma conduta imprópria, insana e violenta do ator, que se notabilizou por interpretar Jack Sparrow em “Piratas do Caribe”.
Os testemunhos relativos a um Depp dependente de drogas, dominador e descontrolado encontram, do outro lado, a figura de uma Amber que declara adorar armas e que tem várias delas, inclusive uma 357 Magnum.
Ela admite que bateu em Depp em várias ocasiões. Também o atingiu com vasos, frigideiras e panelas, mas alega que assim procedeu em razão do clima de embate estabelecido pelo marido. Argumenta que agiu em legítima defesa ou em situações na qual visava a proteger sua irmã. Essas revelações, publicadas por veículos de imprensa como a revista Rolling Stone, incendiaram os “torcedores” do envelhecido pirata.
Antes de se relacionar com Depp, Amber manteve uma relação amorosa com a fotógrafa havaiana Tasya van Ree. Em 2009, foi presa em um aeroporto de Washington por agredir a parceira, que posteriormente se negou a acusá-la. Ambas classificaram a ação como homofóbica e misógina, ainda que a policial que conduziu a prisão fosse declaradamente lésbica.
No tribunal, Depp é exibido em cenas constrangedoras, alcoolizado, desmaiado, sujo e mesmo ferido. Em um e-mail para Paul Bettany, ele diz que ela é uma bruxa que deveria ter seu corpo queimado e depois violado. Nessas comunicações, o ator também se refere a sua antiga parceira, Vanessa Paradis, que descreve como uma “buceta murcha” e uma “puta francesa chantagista”. Detalhe: ela é mãe de seus dois filhos!
Nesse show de horrores que é o julgamento do século, Amber e Depp escancaram o que têm de pior. Ele faz caras e bocas, como um canastrão de filme B. Ela chora sem derramar lágrimas.
Nessa ópera bufa, a estrela que sobe é da advogada do ator, Camille Vasquez, uma hispânica da Califórnia que está assombrando o mundo. É eficiente, pensa em velocidade quântica e causa espanto pela rapidez no gatilho. Em um dos depoimentos de Amber, disparou 47 objeções em 19 minutos.
Arrancou elogios dos bucaneiros ao revelar e provar uma falha na conduta de Amber. Ao receber os 7 milhões de dólares, a atriz anunciou que iria doá-los integralmente à caridade. Não cumpriu, porém, a promessa, efetuando doações parciais. No tribunal, a atriz afirmou que não o fez porque foi processada por Depp. Imediatamente, Camille retorquiu, mostrando que ela teve 13 meses para efetuar a transferência do dinheiro, antes da abertura do processo.
A American Civil Liberties Union afirmou ter recebido apenas parte do valor anunciado e que metade dessa transferência teria sido feita por Elon Musk, o homem mais rico do mundo, com quem Amber teve um caso depois de se separar de Depp.
Em meio a mentiras, acusações e exibições constrangedoras da intimidade humana, Amber e Depp revelam o pior das relações calcadas na busca de fama e dinheiro. Não à toa, parecem pouco preocupados com a própria reputação. Navegando em águas agitadas, estão de olho no butim da aventura dos tribunais, nos milhões de dólares por indenização e no que certamente amealharão, depois, em biografias, séries e entrevistas vendidas. É o capitalismo do escândalo, terceira parte nesta disputa jurídica, em que o lucro prospera acima da honra.