Muhammad Ali e o cafajeste agressor de jornalistas

Por Alceu Castilho 

Continuo intrigado com o valentão de Maresias, esse com a boca torta na foto, que agrediu dois jornalistas do Estadão na terça-feira em defesa de seu condomínio alagado. O nome desse agressor de mulher (no caso, a repórter Renata Cafardo) ainda não foi divulgado.

Aí fiquei reparando na camiseta do cafajeste. Com essa frase do boxeador Muhammad Ali dita ao entrevistador irlandês Cathal O’Shannon, no dia 17 de julho de 1972, dois dias antes de uma luta contra Alvin Lewis:

— Se você sonha em me derrotar, é melhor você acordar e pedir desculpas.

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Muhammad Ali tinha 30 anos e venceu Lewis. Ele já era uma estrela e um gigante, não somente por seu 1m91. Não ficou famoso apenas pela sua competência no ringue. E muito menos por uma ou outra bravata dita a um jornalista. (Ali atendia jornalistas com elegância.)

Ele entrou para a história como atleta, um dos maiores do século 20, e como ativista. Em defesa dos negros e dos direitos civis, entre eles o direito à moradia.

Como ativista, de que lado da Rodovia Rio-Santos estaria ele, neste Brasil extremo de 2023?

Do lado dos pobres mortos e feridos após o deslizamento das encostas na Serra do Mar ou do lado desse agressor de mulheres, morador de um condomínio d̵e̵ ̵l̵u̵x̵o̵ cafona em Maresias?

(Flagrado na foto de Tiago Queiroz, o outro jornalista agredido.)

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Ali flutuava como uma borboleta, diziam. Pairava também politicamente: em 2010, ajudou a ONU a arrecadar fundos para as vítimas de terremoto no Haiti.

E picava como uma abelha. Negou-se a lutar no Vietnã: “Nenhum vietcongue me chamou de crioulo”. Seu posicionamento em 1966 é um dos dos mais importantes já feitos por um esportista no planeta:

— Por que me pedem para vestir um uniforme e me deslocar 10.000 milhas para lançar bombas e balas no povo marrom do Vietnam, enquanto os negros de Louisville são tratados como cachorros, sendo-lhes negados os mais elementares direitos humanos? Não, não vou viajar 10.000 milhas para ajudar a assassinar e queimar outra nação pobre para que simplesmente continue a dominação dos senhores brancos sobre os povos de cor mais escura mundo afora.

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Conclusão: se você é um completo babaca

— um esquentadinho anônimo qualquer de Maresias —

e ousa vestir uma camiseta com uma frase de Muhammad Ali você devia acordar para a realidade brasileira e pedir desculpas.

Alceu Castilho é jornalista e diretor do site De Olho nos Ruralistas

 

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