Otávio Frias Filho (foto) era o único dono de jornal das grandes corporações que refletia em voz alta, no século 20, sobre o que fazia e sobre o que os colegas do setor deveriam fazer.
No começo dos anos 2000, o publisher da Folha aconselhou o Estadão a ser o que sempre foi e deixasse de querer se modernizar. Disse mais de uma vez em conversas públicas e entrevistas.
Otavinho entendia que o Estadão deveria continuar sendo um senhor vetusto, de preferência de fraque, para preservar sua reputação conservadora e seu público.
A Folha, essa sim, poderia usar minissaia e pintar o cabelo de azul, para manter atualizada sua pretensa e constante inovação.
O Estadão continuaria como o velho aristocrata paulistano que impõe respeito por ser velho, e a Folha seria a louquinha cosmopolita do jornalismo do século 21, aberta à diversidade e às diferenças.
Otavinho morreu em agosto de 2018. A sua Folha está irreconhecível e o Estadão é diferente do que ele imaginava. A alma da Folha envelheceu, e o Estadão anda por aí de sapatênis, camisa polo e bermudinha apertada.
O jornal de Otavinho não perseguiu a vocação que ele imaginava ter construído com as reformas do Projeto Folha.
E o Estadão, com problemas financeiros crônicos, brigas familiares e sempre candidato a morrer logo ali, quando se aprofundasse a transição do papel para o mundo virtual, hoje mete furos semanais na Folha.
A morte de Otavinho levou para a Folha problemas familiares que eram dos Mesquitas no Estadão e suas incertezas.
Mas o que se revela como percepção pública, e o que interessa mesmo, é a degradação da imagem de um jornal que pretendia ser plural.
A Folha que ataca Lula todos os dias, sempre na tentativa de apontar para a quebra da economia, sofre da síndrome do ninho vazio.
A velha direita tucana, que um dia sonhou em ser de centro-esquerda, não existe mais, e o que sobrou foi o ninho sem ninguém dentro.
A direita dita moderna que sustentava a Folha está acomodada desde 2018 no ninho do bolsonarismo.
Essa direita sem ninho próprio, que fez um puxado na extrema direita, que não conseguiu produzir uma alternativa de terceira via, que não tem nem resiliência para persistir, essa direita ressentida espera que a Folha faça o que vem fazendo.
Que se alie ao projeto de Roberto Campos Neto e da Faria Lima de inviabilização da economia. Que diga o que a porção fascista da Fiesp não tem coragem nem talento para dizer. Que tente reabilitar o que sobrou de Sergio Moro e do lavajatismo.
E que não abandone a possibilidade de sobrevivência do bolsonarismo sem Bolsonaro, porque é o que pode restar do que existe desde o golpe de 2016.
Não é improvável que daqui a alguns meses a direção do jornal encomende pesquisas ao Datafolha sobre as chances de Michelle.
E que, na sequência, faça editoriais neopentecostais de exaltação das
qualidades da mulher de Bolsonaro.
Se a Folha publicou uma entrevista com Steve Bannon um dia antes do retorno do ex-acampado de Orlando ao Brasil. Se exaltou a extrema direita em editorial, defendendo que o bolsonarismo é uma possibilidade de oposição capaz de dar vigor à política brasileira.
Se indicou, no mesmo editorial, que a democracia poderia ganhar muito com a oposição saudável do bolsonarismo.
Se vem defendendo com determinação a autonomia do presidente do Banco Central na sabotagem da economia. Se consegue até comparar os exageros de fala de Lula com os de Bolsonaro.
Se é capaz de todas essas façanhas, a Folha pode, a qualquer momento, apresentar uma lista de virtudes de Michelle e iniciar os trabalhos em favor da candidatura da ajudadora de Bolsonaro.
Tudo é possível. A Folha faz média com o fascismo e dedica-se a produzir marola porque não consegue mais ser um jornal de afronta pelo jornalismo, pela imposição do material surpreendente, denso e exclusivo.
Leva furos do Globo, do Estadão e de fora do grupo dos grandões todas as semanas. Não impõe uma pauta por mais de um dia e, para compensar, se esforça para ter um time de colaboradores cada vez mais reacionário.
O jornal tem hoje mais reaças e doutores de Harvard entre os articulistas do que jornalistas na redação.
O projeto Folha é o da harmonização à la extrema direita, para que o jornal fique cada vez mais com a cara do eleitor de Bolsonaro, sem Bolsonaro.
A memória de Otavinho não merece. A Folha desistiu do que um dia sonhou ser e engajou-se sem escrúpulos ao projeto de perpetuação do bolsonarismo.
Moisés Mendes é jornalista em Porto Alegre. Foi colunista e editor especial de Zero Hora. Escreve também para os jornais Extra Classe, Jornalistas pela Democracia e Brasil 247. É autor do livro de crônicas ‘Todos querem ser Mujica’ (Editora Diadorim)
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A folhinha ou falha de são paulo, como preferirem, em um almoço oferecido ao então sindicalista Lula, e por ocasião das eleições que se aproximavam, seu publisher Otávio Frias Filho, questionou se o metalurgico sentiase “preparado” para ser o Presidente do Brasil?…… um total e enorme preconceito de quem se sente superior!…… Desde então, nunca mais assinei o jornal e praticamente não o li mais!….. reiteradamente é presunçoso e se pretende o jornal “mais democratico do Brasil”!….. Ledo engano, pois na ditadura civico-militar de 21 anos, ele fornecia seus caminhões de entrega dos jornais, para transportar defuntos de torturados pelos militares ao cemitério clandestino de Perus!….. e chamou o período de “ditabranda”!…… Sou completamente Anti-folha!…… Pietro.