Jamais esqueceremos os crimes do “Curió”

Por Silvio Queiroz

Bolsonaro recepciona Sebastião Curió

E lá se foi o “major Curió”. Sebastião de Moura era major do exército quando foi enviado ao sul do Pará, em 72, para chefiar a operação final contra a guerrilha do Araguaia.

Tocou o terror na população civil, em escala desconhecida até então na história do Brasil – e jamais repetida, até hoje. major na época, virou “coronel”, no sentido fundiário do termo.

Vencida a guerrilha, massacrados os combatentes e escondidos os corpos, Curió tornou-se o “dono” da área. distribuía títulos de terra, regularizava posses: ninguém se estabelecia naquela região do Sul do Pará sem dizer amém a ele.

Foi deputado, cacique político, deu nome até a cidade: Curionópolis, nascida do garimpo na Serra Pelada. lá, o ouro foi descoberto uns poucos anos depois do massacre dos últimos guerrilheiros remanescentes. ninguém garimpava ou vendia ouro sem passar por ele.

Mais um personagem da ditadura que se vai. sem ao menos ter esclarecido o que fez. e o que mandou fazer. e o que acobertou, ainda que não soubesse exatamente o que foi feito.

Curió tinha a idade que teria meu pai, morto há 20 anos e, como ele, oficial do exército a serviço dos órgãos de repressão da ditadura, como o DOI-Codi do II Exército, em SP, onde meu pai serviu de 69 a 73, sob comando do igualmente infame e falecido coronel Brilhante Ustra. Nenhum deles prestou contas do que fez, nem respondeu pelos crimes cometidos: tortura, assassinato, ocultação de cadáver. alguns, tipificados como crimes contra a humanidade.

Mal passado mais um “dia dos pais”, os fantasmas da ditadura seguem nos assombrando. para mim, em especial, na lembrança dilacerada de um pai que amei com toda a intensidade da infância. e de quem jamais vou saber exatamente o que fez, ou fez que não sabia que era feito.

Tentei evitar o tema no domingo – já machucou muito meu coração e vai machucar para sempre. mas com ele, o pai com quem sempre busquei me parecer, não aprendi a me omitir.

Dói no mais fundo da alma, mas é preciso dizer. os crimes da ditadura não podem, não vão ser esquecidos. ainda que mais esse criminoso, codinome Curió, voe para a impunidade.

 

Silvio Queiroz é jornalista, colunista do jornal Correio Brasiliense

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