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Governador do Rio de Janeiro cria escolas cívico-militares com fins eleitoreiros

Por Sonia Castro Lopes

Em uma decisão autocrática, por meio de uma canetada, o governador do Rio de Janeiro, Sr. Claudio Castro, quer transformar as escolas públicas da Rede FAETEC em escolas cívico-militares. O decreto nº 48.003 de 23 de março de 2022 instituiu o Programa Escolas Técnicas Cívico-Militares nas instituições de ensino da rede Faetec por meio de parceria entre a Secretaria de Ciência e Tecnologia, a Secretaria da Polícia Militar e a Secretaria de Defesa Civil e Corpo de Bombeiros.

A rede Faetec (Fundação de Apoio à Escola Técnica) é uma instituição pública fluminense de ensino técnico criada em 1997 e congrega instituições de ensino profissional em todo o Estado do Rio, inclusive mantém alguns cursos superiores como, por exemplo, o curso de pedagogia do Instituto Superior de Educação do Rio de Janeiro (o lendário e tradicional Instituto de Educacional dos anos dourados) – atual ISERJ e o Instituto Superior de Educação de Campos (ISEPAM).

Profundamente interessado em obter apoio do governo federal à sua candidatura para reeleger-se governador do Estado, o Sr. Cláudio Castro toma uma atitude arbitrária sem consultar especialistas da área acadêmica e muito menos – e mais importante – as comunidades escolares compostas por professores, alunos e demais profissionais do ensino. A rede Faetec tem passado por dificuldades imensas herdadas de governos anteriores e ao invés de investir na melhoria dessas escolas, o governador decreta essa medida autoritária para demonstrar ao ‘chefe’ sua subserviência.

Todos sabem do apreço do atual presidente ao projeto das escolas cívico-militares, em sua opinião, modelos de qualidade e excelência de ensino. Ora, a  história nos mostra como a escola foi utilizada por governos autoritários para incutir em crianças e jovens sentimentos e condutas que se enraizaram, como por exemplo, a meritocracia, a hierarquia, a disciplina, a maneira de pensar e agir de forma muitas vezes preconceituosa e excludente. A escola, o quartel e a igreja são espaços onde, muitas vezes, inexiste a tolerância e o respeito às diferenças. Poderão ser responsáveis, portanto, pela naturalização de comportamentos de ódio, racismo, xenofobia, sexismo, homofobia e outros tantos que se encontram estruturados numa sociedade de passado escravocrata, oligárquico e autoritário como a nossa.

Ainda em 2019, no lançamento do Programa dessas escolas, o presidente atribuiu à democratização do ensino a causa das mazelas do ensino público no país. Utilizando-se de discurso análogo, o ministro da educação à época, Abraham Weintraub, afirmou que as escolas cívico-militares seriam uma forma de homogeneizar o ensino, indo, na contramão de tudo o que prega a Constituição Federal de 1988 e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDBEN/1996) sobre a educação no país.

Parece que a luta  travada desde ontem por parlamentares da ALERJ – destacando-se os deputados Flavio Serafini (PSOL) e  Waldeck Carneiro (PSDB), além do posicionamento contrário dos profissionais de educação da Rede Faetec  – conseguiu contornar parcialmente o problema. Soube-se agora que o artigo 2º do Decreto foi alterado e apenas as escolas da Faetec que vierem a ser inauguradas obedecerão a essa regra. De acordo com a nova redação dada ao artigo  “Para a implementação do Programa serão consideradas as instituições criadas e autorizadas no modelo cívico-militar.”

De qualquer forma, não admitiremos retrocessos. As lutas pela democratização da educação avançaram de forma consistente com a promulgação da CF e da atual LDBEN, possibilitando a inclusão de um sem número de indivíduos ao espaço escolar. A escola tornou-se um espaço que deve acolher a diversidade, um espaço no qual idéias diferentes podem circular e conviver através do diálogo. O Programa das Escolas cívico-militares vai justamente na contramão desses princípios quando defende um ensino padronizado, homogeneizante, acrítico em nome de uma formação sólida em termos morais e pedagógicos para os filhos dos ‘cidadãos de bem.’ Os defensores do projeto argumentam que o mesmo possibilita ‘resgatar os valores da pátria e da família.’

A bandeira de uma escola pública, gratuita, obrigatória e universal foi defendida pelos Pioneiros da Educação Nova em seu Manifesto à Nação em março de 1932. Hoje, noventa anos depois esses princípios encontram-se ameaçados. Uma escola universal é para todos e não apenas para uns poucos que desejam ver seus filhos alinhados aos valores de uma pauta conservadora e retrógrada.

 

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