Por Simão Zygband
Um das formas mais cruéis da intolerância é a chamada gordofobia. Ela ainda não é combatida por lei, já que a sociedade parece concordar que esta não é uma questão discriminatória, mas sim uma frescura daqueles que estão acima do peso.
O mercado de trabalho é extremamente seletivo, para não dizer “meio nazista”, com aqueles que não estão de acordo com padrões que eles julgam ser mais apropriados para exercer uma atividade profissional, seja no sexo masculino ou feminino (e mais complicado ainda quando não se enquadrar dentro destes dois conceitos).
Assim, o trabalhador moderno não pode estar acima do peso, deve preferencialmente ser da cor branca, não ser homossexual, será mais bem sucedido se falar ao menos duas línguas para trabalhos de nível médio, precisa estar sempre “apresentável”, o que significa não usar peercings, brincos ou tatuagens muito evidentes (podem existir de maneira “comportada”) e, se for mulher, preferencialmente ser mais “bonitinha”em detrimento da “feinha”, em geral envolvendo aí a questão racial.
Trata-se, portanto, de um mundo de perigosos esteriótipos. O obeso é considerado um doente, preguiçoso, um indolente que não consegue se livrar do vício da gula. É bem pior avaliado do que quem tem a cor de pele negra ou não se encaixar dentro dos conceitos de masculino e feminino. Mas o gordo, sim, só é desta maneira por que quer, por que não tem força de vontade e, consequentemente, terá preguiça de fazer o trabalho.
Jornalismo gordofóbico
A TV Vanguarda, por exemplo, uma afiliada da rede Globo na cidade de São José dos Campos, no Vale do Paraíba paulista, demitiu esta semana a jornalista Marcela Mesquita, ao retornar de licença-maternidade. Ela trabalhou por 12 anos na empresa.
Marcela relata que foi afastada do vídeo em 2017 e só retornou no início de 2020. “Fiquei quase dois anos e meio na geladeira”, disse. Ela alega que na época foi informada pela chefe de redação, Terezinha Almeida, que a direção tinha decidido a afastar por que estava “fora do padrão, acima do peso”. Teve que recorrer a psicólogos, psiquiatras e nutricionistas para “poder voltar”, mas não conseguiu.
Mas, o caso de “gordofobia” contra a repórter Marcela Mesquita não é o único ocorrido na TV Vanguarda, que é de propriedade de José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, o Boni. O mesmo episódio ocorreu com a jornalista Michelle Sampaio, desligada do canal após 16 anos de trabalho, sob a alegação que estava acima do peso. “Fui informada pela diretora de jornalismo que a emissora optou pelo meu desligamento por eu não ter atingido o objetivo que era emagrecer”.
Na esteira da intolerância estão governos de extrema-direita como o de Jair Bolsonaro, um governante declaradamente racista (não deixaria meu filho namorar uma negra, por que não discuto “promiscuidade”), misógeno (a minha última filha nasceu mulher por que dei uma “fraquejada” ou se dirigindo à deputada Maria do Rosário, do PT, dizendo que “jamais ia estuprar você por que você não merece”) ou homofóbico (ter filho gay para mim é a morte. Digo mais: prefiro que morra num acidente do que apareça com um bigodudo por aí. Para mim ele vai ter morrido mesmo”).
Por ser obeso, sei muito bem o que significa a “gordofobia” e outras manifestações de intolerância com os não iguais.