Do diminutivo como grande mistério nacional

 
Adianto que não se trata de tema novo. Todo mundo dá pitaquinho nessa questão, de linguísticas a antropólogos, de literatos a sociólogos. E ainda que ocorra acerto no diagnóstico, sempre falta um tantinho a decifrar.
 
A principal hipótese é que sejamos eternamente infantis. Um país menininho (que é o diminutivo do diminutivo) que ainda resiste na dimensão da realidade reduzida.
 
Afirma-se por aí que fizemos desse hábito bobinho uma manifestação de carinho, palavra que casou para sempre a raiz e o sufixo. Então, dizemos, que lindo bebezinho, que boquinha sensual, que Fusquinha mais lindinho o seu.
 
Deseja-se uma de varanda, com um quintal e uma janela para ver o sol nascer. O quê? Uma casinha branca, oras!
 
Veja que o diminutivo pode até se assumir como superlativo. Ao garantir que a camisa do Tio Vicente estava branquinha, Dona Maria queria dizer que ficara branquíssima, apropriada para ser usada no escritório.
 
Fizemos tanto disso que, lusitanamente, adaptamos os diminutivos também ao maldizer, ou seja, para realmente diminuir o que nos desagrada. E aí vem: quem esse professorzinho pensa que é?
 
Não basta chamar a rival de sirigaita. Precisa que seja sirigaitazinha. E esse time que não ganha uma? Pratica mesmo um futebolzinho que dói nas vistas. E aquela outra ali? Bonitinha, mas ordinária.
 
Em minha modesta opinião, que pode inovar, repetir ou plagiar sem querer, o diminutivo aqui tem origem em nossa cultura colonial, de opressão, carência e miséria.
 
Nas naves que atravessavam o oceano, um pãozinho já era muito para um marujo famélico. Afinal, exigir o justo nunca caiu bem na periferia ibérica do Império Romano.
 
Quem tem medo de pedir, não pede o naco a que tem direito, mas um pedacinho. Essa conduta viria a marcar tremendamente o ethos nacional. Muitos de nós temos vergonha do que é graúdo. Precisamos dessa discrição modesta para exibir suposta virtude.
 
Um festão de arromba soa como excesso, como ostentação e desperdício. Então, no sábado, nos convidam para uma cervejinha, mesmo que, ao longo da noite, a galera seque dez dúzias de litrões.
 
Quem pretende passar uma temporada na sua casa, recorre ao mesmo expediente. “Não se preocupe não, que eu me arranjo em qualquer cantinho”, afirma o visitante.
 
Como sufixo acolchoado, serve até para diminuir a gravidade da falta. “Estou chegando, agorinha”, diz a atrasada. “Faço um remendozinho aqui e ninguém vai reparar”, arremata outro.
 
Sempre me assustei com a palavra pelourinho, que antes de batizar um lugar, definia um rito de punição. O latim inventou o pillorium, que designa uma pilastra. O francês o simplificou como pilori.
 
E a cultura lusófona criou esse tal pelourinho, lugarzinho infame de castigar mulheres desobedientes, homossexuais, ladrões, hereges e seres humanos escravizados.
 
Será que a ideia era reduzir a gravidade do pecado? Seria um castiguinho, uma crueldadezinha, que assim diminuída passaria despercebida aos olhos de Deus? Não sei.
 
Assim como desconheço o impacto na opinião pública do termo rachadinha, tipo de esquema que fez a fortuna da grande família vivendeira. Talvez o propósito seja comunicar: “ah, mas é só uma rachadinha, uma coisinha sem importância”. Assim como se passou com a Covid-19, nomeada como gripezinha.
 
Lá em Brasília, o que se vê, entre botinudos, gente do executivo e coronéis do parlamento é uma rachadona, imensa, gorda, volumosa, gordurosa, debochada e indecente, própria de um negócio despudorado, que chamamos de Centrão.
 
Para acabar com essa farra, nada como uma eleiçãozinha, magrinha que seja, quietinha, que nos devolva um pinguinho de esperança. Não exigimos muito. Basta-nos um Lulinha. Com paz e amor.

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