Construir Resistência
Foto: Arquivo pessoal

Deus te ama, mas não muito

 Luis Otavio Barreto

 

O pastor José Olímpio, da Assembleia de Deus em Alagoas, disse que ia orar para que o senhor de Paulo Gustavo, Satanás, o levasse para junto de si, no inferno; não surpreende, em nada. Esses pastores pentecostais e neopentecostais, em geral, possuem essa personalidade bélica, combativa e excludente, ah, mas não são os únicos! A despeito do conceito de Deus e do que representa, a igreja evangélica, com raras exceções, épródiga em condutas supressivas. A católica também, mas com mais leveza e sutileza calculada.

 

Na igreja evangélica há um diferencial que possibilita o exercício daquele tipo de conduta: o acompanhamento de perto. Pastores, líderes, ministros e diáconos formam uma rede cuja capilaridade atinge a todos os setores da igreja, sem a menor exceção e, em muitos casos, limites. O argumento para isto se baseia na autoridade investida pelo ‘Espírito Santo’, a saber, eles defendem.  Há que se levar em consideração, também, o “serviço informal”; ‘conselhos’, conversas e o disse-me-disse que se estabelece entre um membro e outro, até que o assunto seja tema de reuniões entre as partes: membro e liderança.

 

Com os católicos, o expediente costuma ser diferente: os líderes não participam tão incisivamente na vida de seus liderados, até porque as mecânicas litúrgicas dos ofícios são bem diferentes, as rotinas eclesiásticas também. Não vou me ater aqui, esse assunto dá um livro! Voltemos, portanto, a belicosidade do povo eleito; ora, há que se desconstruir a capa romântica que há por cima da religião. Não há pequena, média ou grande manifestação de violência, há manifestação, e isso basta. O que muda é o tipo de agressão e a configuração do expediente pelo qual ela se apresenta.

 

Em São Paulo, por exemplo, a Hillsong Church – que é a moda da vez – procura um teatro para seus cultos. Modernex, ‘pero no mucho’, a igreja segue a linha neopentecostal. Mantém o clichê ‘Ama os pecadores, mas odeia o pecado’, talvez não o cartão de crédito desses pecadores, mas isso já são outros 500… Em entrevista recente, o jovem representante da igreja, na América do Sul, disse que os gays, por exemplo, são bem vindos, mas não poderão exercer nenhum cargo e nem um papel na igreja. Precisam ser ‘acolhidos’ e entender que “Deus transforma”.

 

Nos últimos anos, a igreja brasileira evoluiu, mas, outra vez, pero no mucho! O maior atestado de sua morosidade ‘ético-social-espiritual’ foi a significativa expressão na eleição de Jair Bolsonaro, Flordelis, Witzel e outros…Por outro lado, mostrou algum avanço, no sentido de que há pastoras (o que era impossível, até os anos 80/90) e outros papéis que, até então, só homens desempenhavam, mas ainda continua sendo uma instituição patriarcal e moldada nos arquétipos do machismo.

 

Que a igreja é importante, não há a menor dúvida! Que desempenha papéis fundamentais na sociedade, não se discute! Mas é preciso observar, sem o véu do romantismo, suas condutas e analisar os reflexos disso no comportamento das pessoas. Numa perspectiva mais clara, o que se tem como resultado dessa análise?! O que a fala desse pastor da Assembleia de Deus representa?! O que o silêncio das outras igrejas, em suas particularidades doutrinárias, diz a respeito das últimas impressões sobre a imagem dos evangélicos?! E os católicos, como procedem diante do crescimento desenfreado de um emaranhado de equívocos teológicos, em meio aos próprios escândalos sexuais e financeiros?!

 

Qualquer indivíduo com preceitos evangélicos, crescido na cultura religiosa, dirá “Devemos enxergar somente a Cristo”. Confesso: acho mesmo é que o problema está aí; não enxergam somente a Cristo. É desse romantismo que falo; da complacência com o erro, do não questionamento, do não olhar ao entorno! E por que?!

 

Enfim, enquanto ninguém quiser responder, enxergar, confrontar ou retirar a romântica capa da igreja, pastores e padres continuarão orando e rezando para a morte de paulos, queimando ‘bruxas’, vendendo salvação, feijões contra covid, queimando bibliotecas, negando bençãos, ‘amando o pecador, até a pág.14’ e expulsando os demônios que ela mesma criou.

 

Luis Otavio é músico, pianista e professor de Língua Portuguesa. 

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