Por Luiz Hespanha
Quando cheguei porr’aqui confesso que também nada entendi. Dos letreiros luminosos às milhares de antenas sobre os sobrados; do ascensorista-narrador de andares do Mappin ao buraco do Ademar, à poesia concreta da Paulista, tudo era fascínio. A cidade era “menos gigante” e acabava na Vila Formosa, Parada Inglesa, Lapa e Sto. Amaro. O que sobrava era zona rural. Depois tudo se normalizou e o pulsar do coração na Ipiranga com São João virava taquicardia na pressa para pegar o buso no Anhangabaú ou na Sé.
O fascínio volta e meia virava inquietação e medo, incredulidade e desespero, passividade e indignação, nem sempre modulada emocionalmente, diante do crescimento desembestado: o da cidade e o da miséria. Os sonhos derretiam na correria da sobrevivência e da solidão paulistana edulcorada então pela presença constante da garoa e da japona para encarar o frio.
O corte no tempo subtrai apenas a garoa e japona, hoje raras. A primeira pelas mudanças climáticas provocadas pela estupidez humana. A segunda que perdeu formato e sonoridade poética para termos como agasalho ou jaqueta. Só não subtraiu a miséria amplificada em progressão geométrica pelo exercício deliberado do cinismo, exploração e ganância de uma “elite” política, podre, cruel e criminosa.
Acredito na política como arte e instrumento de transformação. Não é uma crença de conteúdo eleitoral; de achar que urna é depósito de esperança. É enxergar a política como uma necessidade prática, forjada na luta diária pela construção de uma sociedade justa e igualitária, ainda que a política seja utilizada como trampolim de ascensão social de bandidos, à direita, no centro inexistente e, também, à esquerda.
Nada melhor do que a ascensão econômica, a mudança rápida grotesca e brega de gosto, automóvel, vestimenta e endereço para denunciar alguém como mais um candidato a por em prática tudo que diz condenar. Conheci um pretenso líder sindical que justificava a própria ascensão social como demonstração da “emancipação da classe trabalhadora” que fingia defender.
De todas as decepções, a maior que São Paulo me oferece sempre acontece nos períodos eleitorais. E olha que nem era nascido à época da eleição do rinoceronte Cacareco, que recebeu mais de 100 mil votos para vereador. Entra eleição e sai eleição e a cidade e o estado elegem e reelegem cacarecos e ximbiricas. De locomotiva do país, São Paulo já amanheceu várias vezes no pós-eleição como a locomotiva da estupidez.
Eles estão aí, de novo, sempre se apresentando em nome da fé, da família e do combate à corrupção. Merecem nota 10 no quesito fantasia, pois têm um deus particular, defendem a própria família e segurança; e são radicalmente contra a corrupção: a dos outros. Domingo é dia de colocar a mediocridade e a hipocrisia no ostracismo político. É dia de votar na dignidade da espécie, na simplicidade de quem tem compromisso e prática.
Lembro de todos os candidatos que votei até hoje. A maioria dos que se elegeram corresponderam à minha expectativa naquele momento político. Muitos dos que não se elegeram, também. Os que me decepcionaram continuam recebendo o meu mais sincero e cordial desprezo. A quem mantém na prática o compromisso com o semelhante, independente do credo, origem, etnia ou orientação sexual, o meu respeito.
Quero crer que domingo o Brasil e SP darão uma grande lição de história elegendo Lula Presidente, Haddad Governador, Márcio França Senador e deputados e deputadas estaduais progressistas. Chega de cacarecos e ximbiricas. Domingo é 13 SP, é 13 Brasil.
Luiz Hespanha é jornalista, escritor (Breves Memórias da Terra-do-já-teve, Livro das Verdades Inúteis (amazon.com.br), compositor de música popular #CançõesDeAmorDelírioTesãoInquietudeLutaDeClasseEÓcio e, às vezes, fotógrafo.