Centenário Paulo Freire: Canal Construir Resistência & Café Filosófico

Por Sonia Castro Lopes

Na última quarta feira (22) o Canal Construir Resistência (Youtube) em parceria com o Café Filosófico  promoveram um debate em homenagem ao centenário de nascimento do patrono da educação brasileira, Paulo Freire (1921-2021). O evento contou com a participação das palestrantes Sonia de Castro Lopes , historiadora , doutora em educação e professora da UFRJ; Amanda Moreira Silva, doutora em educação e professora da UERJ e Adriana do Amaral, jornalista, mestre em comunicação social e doutoranda pela UMESP. A coordenação da mesa ficou a cargo do professor Francisco Nunes, professor da Faculdade Paulista de Comunicação.

Abrindo os trabalhos, o professor Francisco Nunes explicou a proposta do Café Filosófico, projeto de extensão da FPCO que procura ser um espaço de partilha das pesquisas e de produção de conhecimento com a sociedade. Antes da pandemia era presencial e aberto para a cidade de São Paulo  e agora está sendo realizado virtualmente. Trata-se de uma parceria entre intelectuais, artistas e jornalistas que procuram conectar o espaço da comunicação ao mundo acadêmico.

Em seguida foi dada a palavra à professora Sonia Castro Lopes que discorreu sobre o contexto político no qual emergiram as  reflexões teórico-metodológicas que embasaram a filosofia educacional de Paulo Freire. Lembrou, ainda, do desconhecimento por parte de sua geração da obra do educador que só voltou ao Brasil em 1980 após a Lei da Anistia. Nos tempos em que a educação ainda era vista como redentora – instrumento de promoção social necessário à ordem econômica e política vigentes – Paulo Freire propõe uma educação transformadora, mediadora de um projeto social. Essa transformação só se daria pelo diálogo travado entre professor/aluno/conhecimento o que levaria à descoberta de novas “verdades” e refutaria apriorismos rígidos.

O pensamento de Freire ocorreu no contexto do final dos anos 50 e início dos 60 quando surgiram os movimentos de educação popular, no momento em que o país atravessava um período que a mídia e boa parte da historiografia considerou “os anos dourados” da república brasileira.  Entretanto, 50% da população permanecia analfabeta. A experiência bem sucedida de alfabetização de mais de 300 trabalhadores em Angicos (RN) fez com que o governo Jango convidasse o educador para coordenar o Programa de Alfabetização que seria abortado pelo golpe de 64. No entender da professora, a grande contribuição de Paulo Freire à educação brasileira foi ter reconhecido a total interpenetração entre as dimensões política e pedagógica no fazer educativo. Na visão freireana é impossível entender a prática do magistério sem uma inserção política.

Para a professora Amanda Moreira, não se entende como um educador tão reconhecido internacionalmente seja desconsiderado em seu país. Em sua opinião, o momento  é de resgatar sua memória, falar sobre seu método de ensino. Trazendo a discussão para a contemporaneidade  explicou que Freire foi tão perseguido e combatido em nosso país por defender uma concepção de educação humanista e libertadora. Lembrou que a obra Pedagogia do Oprimido, publicada em 1968 só foi liberada no Brasil a partir de 1974.  Assim, a produção de Paulo Freire se contrapõe à visão hegemônica que sempre pautou a educação brasileira, ou seja, o dualismo que preconizava uma educação de qualidade para as elites e outra mais tecnicista para as classes populares. O objetivo da educação para Freire baseava-se no tripé  diálogo, conscientização e transformação social onde o educando precisa perceber-se como sujeito dessa transformação.

A desigualdade estrutural que caracteriza a sociedade brasileira fez com que a burguesia nunca permitisse a existência de uma educação popular que desafiasse essa estrutura social mantenedora de privilégios e é essa hegemonia educacional que Freire vai questionar. Atualmente estamos cada vez mais distantes da filosofia de Paulo Freire, pois a partir dos anos 90 a educação brasileira vem sendo cada vez mais pautada pelos interesses dos organismos internacionais com uma concepção de educação mercantilista que precariza os processos de ensino-aprendizagem e o próprio trabalho docente. O setor empresarial, hoje, dita a tônica da educação que se almeja para o país.

A última palestrante, a jornalista Adriana do Amaral, procurou destacar a dimensão humana de Paulo Freire. Nascido no Recife em uma família de classe média baixa suas primeiras experiências com educação foram lúdicas, por meio da atuação da família. Formou-se advogado, mas escolheu a profissão de professor que para ele não é o que apenas ensina, mas o que também aprende através do diálogo, da troca de experiências com seus alunos. Considerado comunista pela ditadura civil-militar que governou o país por duas décadas, Paulo Freire conheceu o exílio e exerceu o magistério em diversas universidades mundo afora.

Voltando ao Brasil tornou-se protagonista nas mudanças que levaram o país à democarcia. Integrou o secretariado da prefeita Luiza Erundina durante sua gestão na cidade de São Paulo (1989-1993). Como secretário de educação deste governo,  promoveu a educação popular, a formação do magistério e a construção de uma escola dialógica, horizontalizada. Para Adriana, o método freireano nunca foi empregado no Brasil, mas as ideias estão nas escolas, nas universidades, nos sindicatos e por isso Paulo Freire vive. Como jornalista, Adriana teve o privilégio de entrevistar Freire em 1989, fato que a afetou profundamente e a levou a ler e refletir sobre o pensamento e as práticas do grande educador.

Após as falas dos convidados, Francisco Nunes propôs um debate a partir de questões enviadas pelos espectadores que participaram ativamente do seminário. Muitos de nossos alunos e colegas ali estavam, interessados em participar da discussão e compartilhar suas próprias experiências. A todos agradecemos pela audiência. Pelo retorno recebido concluímos que a iniciativa foi bastante exitosa e nos deu a certeza de que a parceria Construir Resistência/Café Filosófico terá desdobramentos profícuos.

 

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