Barriga de fome

#paratodosverem: simulando a bandeira do Brasil, no lugar do círculo azul um prato de comida e ao invés da frase ordem e progresso lê-se Tem Gente Fome. Dois braços e mãos agarram o prato

Por Adriana do Amaral

 

Nas histórias do #SítiodoPicapauAmarelo, a boneca de pano, Emília, era conhecida como uma “torneirinha de asneiras” pelas “bobagens” que dizia. Mas Emília provocava à reflexão, com as suas verdades mal compreendidas. A verdadeira “boca de gamela” tem o Presidente da República, que nos remete a outro personagem do programa humorístico, aquela que quando abria a boca só falava besteiras e ouvia do marido: Cala a Boca, Ofélia!, ops Jair.

 

O presidente não perde uma oportunidade para ficar calado. Pelo contrário, provoca, instiga, indigna os desafetos e é aplaudido pelos afetos. Ele sabe que quando abre a boca para vomitar suas frases malditas, ele ganha a mídia e polemiza.

 

Na noite de terça-feira (6) ele criticou o #isolamentosocial, uma das poucas medidas que diminuem a possibilidade de contaminação pelo #coronavírus, rebatendo que o sedentarismo engorda. Desprezou as pesquisas que indicam que o povo brasileiro está morrendo não apenas em consequência da #Covid-19 como de fome.

 

“Tem uma pesquisa aí que diz que quem tem uma vida saudável é oito vezes menos propenso a ter problema com a Covid”, justificou o capitão. Citando a própria barriga, sinalizou que as pessoas estão engordando na #pandemia.

 

Enquanto isso, a barriga do povo chora. De fome. O povo vai dormir em jejum e a barriga ronca. De fome.

 

O presidente, que saiu ileso cerca de 70 pedidos de impeachment, até agora, segue com a mesma retórica desde que foi empossado, em janeiro de 2019. Irônico, ele perguntou à audiência com quem conversou na noite de terça-feira:  do que eu não sou culpado aqui no Brasil?

 

Não podemos culpar o clima e a seca, que gerou verdadeiras crises internas com os processos migratórios, como a seca de 1915, eternizada na obra O Quinze, de Raquel de Queiroz.  Podemos culpar a gestão federal e o seu descaso social.

 

Mas não é só ele, não é mesmo? Junte-se a ele parte dos políticos, empresariado e elite. “Sigam-me os bons”, diria o anti-herói.

 

O que o presidente do Brasil parece ignorar é que a postura e irresponsabilidade dele têm sido questionada no mundo. Jair Bolsonaro foi denunciado por “crime contra a humanidade” e o Tribunal Penal Internacional de Haia analisa se seguirá ou não os processos por genocídio e ataques contra os povos indígenas.  As denúncias partiram da Comissão Arns e o Coletivo de Advocacia em Direitos Humanos, do Cacique Raoni e de entidades sindicais. Os jornais internacionais também têm denunciado suas práticas.

 

O comandante em chefe diz o que quer, e todos somos obrigados a ouvir as asneiras ditas por ele. Um representante, eleito democraticamente é verdade, mas pela minoria da população. Alguém que mais de uma vez provou que não se importa com a vida humana (dos outros), com os direitos humanos (do povo brasileiro), e com o meio-ambiente (do Brasil).

 

Pelo andar da carruagem continuaremos sendo atropelados pelo bonde de uma história que mescla horror e dor. Quatro anos de poder, décadas de retrocesso para a humanidade brasileira.

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