Construir Resistência

10 de novembro de 2021

Histórias de Ipanema

Por Marlene Carvalho Conversa de feira O que a jovem vai levar hoje? pergunta o feirante a uma senhora de uns setenta anos, que voltava da praia. Ela não compra nada e eu digo: aqui é o único lugar em que ela pode ser chamada de jovem. Ele cai na risada. Na feira da Praça Gal. Osório, em Ipanema, que eu frequento fielmente há mais de quarenta anos, fui chamada de jovem até uma certa idade, agora não mais. Dois ou três feirantes têm me chamado de mãe: acho péssimo, mas não reclamo , eles querem agradar. Uma variação possível é ser tratada de madrinha, como faz um cadeirante sem pernas a quem eu dou esmola . A última novidade em matéria de tratamento interclasses é chamar as mulheres de doutora. Parece uma extensão do velho costume de chamar de doutor qualquer homem branco, hétero, de classe média, que tenha carro. Chegou a nossa vez. O feirante que me doutorou é negro, alto e forte, vende frutas selecionadas e tem dois ajudantes. Ele costumava falar umas frases em francês quando apareciam franceses na área. Bonjour, madame. C’est très sucrée! Um dia eu lhe perguntei se tinha vivido na França, ele riu, disse que aprendeu na feira. Mas agora os turistas desapareceram e ele está renovando seu estilo. Eu comprei apenas uma dúzia de tangerinas (très sucrées) , enquanto ele esgrimia meu título: O que mais, doutora? Tudo ok, doutora? Até pra semana, doutora.                                                                                     Comida de rua A Rua Antonio Parreiras, em Ipanema, não tem estabelecimentos comerciais, mas ali encontramos, a preços módicos, comidinhas tradicionais que ninguém tem tempo ou paciência para fazer. Os vendedores fixos são três. Um rapaz alto, forte e muito sério ocupa o melhor ponto, próximo do portão do Hospital de Ipanema. Numa vitrine montada sobre duas rodas, traz empadão de frango, quibes fritos, cocadas, bolo, café e Guaravita. Chega antes das sete horas e sai por volta das duas, regular como um funcionário público. A segunda vendedora se instala a alguns metros do primeiro (as distâncias são respeitadas com rigor). Sua vitrine é menor e a postura, mais relax. Tem uma jovem ajudante de penteado afro e põe na calçada três banquinhos de plástico encardidos. Um cartaz anuncia os preços: café, 1 real; pingado, 2 reais; bolo de copo, 4 reais. Por algum tempo, fez propaganda de um quarto para alugar por 400 reais. Um senhor grisalho, magro e discreto é o terceiro vendedor , na esquina da Rua Jangadeiros. Seus produtos são uma festa para olhos gulosos: bolo de banana marrom brilhante de calda queimada, cuscuz branquinho eriçado de fiapos de côco, empadão de frango de crosta dourada, bolo mármore, cocadas pretas e brancas, pudim de leite condensado. As comidas são cortadas em pedaços uniformes, tudo muito bem apresentado. A freguesia dos três vendedores são os pacientes da fila do Hospital, as pessoas que nele trabalham, os funcionários da Telefônica, os porteiros e entregadores da Antonio Parreiras. Melhor isso que hambúrguer e fritas a preços absurdos.   Marlene Carvalho é escritora e professora aposentada da UFRJ.

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E aí, progressista: Por que tanta grosseria, arrogância e desamor? Por quê?

Por Walter Falceta Jr. Primeiramente, antes de sorrisos, beijos e abraços, vamos à realidade histórica. A sociedade patriarcal oprime e agride as mulheres. Em sua estrutura bestial, o sistema escravista e racista insulta a civilidade. O preconceito no campo das orientações sexuais e afetivas é um murro na boca do estômago. A exploração econômica e a desigualdade constituem crimes hediondos contra a humanidade. Nós, do lado de cá, sabemos disso, e lutamos pela transformação, ou seja, por um mundo que respeite e valorize as diferenças, que patrocine isonomias e que universalize direitos. Em tese, é o que nos faz somar à esquerda. A direita busca fortalecer supremacias que garantam a conservação de privilégios. Nós, desde sempre, remamos na direção contrária. Diante de tamanhas ofensas e agressões, realmente é difícil exigir gentileza dos oprimidos, dos famintos e dos excluídos. Mas aí a gente se lembra de um sujeito argentino-cubano que ensinou o seguinte: “hay que endurecerse, pero sin perder la ternura jamás”. Sim, é preciso ter gana, coragem e garra, mas se cedemos aos costumes e condutas do bárbaros, que diferença, efetivamente, haverá entre nós e eles? Luiz Gama é, na minha opinião, o maior dos paulistas, ainda que não tenha nascido aqui. É um herói poeta, craque no Direito, referência formidável da negritude. Sua biografia, no entanto, revela um homem que combinava a fibra resistente à doçura solidária dos santos. Gama recebia homens brancos pobres em sua casa. Tratava-os com bondade e os auxiliava de graça em suas litigâncias jurídicas. Francamente, eu queria ter amigos como Luiz Gama, um homem universal, de visão ampla, justo, amistoso e leal. Carlos Marighella, meio sudanês, meio italiano, profundamente baiano e brasileiro, era outro poeta, de coração afável. Ria e fazia rir, zombando de si mesmo. Combinava o rigor da disciplina ao humor de incentivo. Gostava de crianças e de brincadeiras. O nosso amigo de Nazaré, o carpinteiro, era igual. Pedia sempre que lhe mandassem as criancinhas, para participar de seus folguedos e traquinagens. Era também o viajante que adorava conversar com os estranhos, com os estigmatizados, como fez com a samaritana. A rigor, na história, os maiores revolucionários foram criaturas amorosas. Suponho que praticavam a empatia simpática porque foram educados ou se educaram para fazer avançar o rito civilizatório. Nosso Paulo Freire fala da importância da amorosidade na obra de conserto e aperfeiçoamento do mundo. E ele tem razão. Nada se faz de profundo e duradouro sem a tolerância, a compreensão e o colocar-se gracioso no lugar do outro. Quando não somos educados, como explicava o professor, somos oprimidos que sonham com uma falsa redenção, na qual nos tornamos opressores, copiando nossos carrascos. Essa brandura elegante é extremamente poderosa. Nós a vimos no querido reverendo Martin Luther King, Jr., na feminista negra Sojourner Truth, no metalúrgico Lula e, hoje, a encontramos fulgurante no Padre Julio Lancellotti. Ontem, soube da passagem prematura de Dirce Koga, e assim me inspirei para redigir este texto. Assistente social e professora, a companheira era também fonte inesgotável de candura, capaz de animar os espíritos mais combalidos. Sinceramente, creio na força imensa dessa rebelião do bem. Em um mundo de recriminações, perseguições, ressentimentos, egolatrias, bullying, abusos, estigmatizações e estupidez, mesmo dentro das trincheiras progressistas, é esse amor vasto, iluminado e contente que faz a verdadeira diferença. Já dizia o poeta e profeta José Datrino, aquele que rabiscava suas ideias debaixo de pontes e viadutos: “gentileza gera gentileza”. Por que não tentar? Por quê?   Walter Falceta Jr. é jornalista e co-fundador do Coletivo Democracia Corinthiana (CDC)

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Com a “liberação”, maioria expressa pavor da Covid-19

Por Simão Zygband   Mesmo informalmente, realizei uma pesquisa no meu facebook, junto a meus amigos,  sobre a liberação dos procedimentos de segurança na proteção contra a pandemia de Covid-19. Já estão liberados, seguindo alguns protocolos mínimos (que eu duvido muito, é verdade, que estejam sendo respeitados), salas de cinema, espetáculos, teatro, estádios de futebol, aulas presenciais, bares e restaurantes. A Prefeitura de São Paulo pensa agora em liberar as máscaras de proteção quando se está ao ar livre. Muitas pessoas já andam nas ruas, principalmente em municípios da Grande São Paulo, sem máscara, como se a pandemia já tivesse acabado. No Brasil, já morreram até o início de novembro, cerca de 610 mil pessoas de Covid que poderiam ter sido evitadas, em sua grande maioria, se o elemento que ocupa a presidência da República tivesse tido uma atitude mais ativa e não simplesmente negado a doença e tentado empurrar medicamento obsoleto que não evitava as mortes. Também tentou adquirir imunizantes ganhando uma “caixinha”. Destes milhares de mortos, 150 mil ocorreram em São Paulo. Apesar dos números estarem caindo, sobretudo depois da vacinação, é momento de relaxar e abaixar a guarda? Os resultados são surpreendentes, mesmo sendo os meus amigos do facebook, em sua maioria, muito atentos com a questão da segurança em relação ao Covid. Mas já serve para nos dar um bom parâmetro do que pensam eles. Eles interagiram a uma pergunta bem informal, “Será que sou o único louco que ainda tem medo da Covid”, e 347 pessoas deram like ou semelhante e 240 fizeram comentários, majoritariamente preocupados, mostrando ainda muito respeito com a doença. As respostas, confesso, foram as mais perturbadoras. Pincei algumas que mais me chamaram a atenção, que as reproduzo abaixo. A maioria das pessoas são de São Paulo, mas há de outros estados também como do Rio de Janeiro, Minas Gerais e Pernambuco.   Monserrat Gonzalez Bevilaqua – Pois, tenha (medo)! Eu peguei! Estou no 13 dia, hoje. Agora que levantei melhor. Uma paulada! Mesmo com duas doses de Astraza eneka. Muito álcool em gel, máscara e tudo. Fiz o máximo pra não pegar, mas um colega de trabalho contraiu. Peguei trabalhando. Walter Falceta – Ainda morrem uns 300, 400 por dia. 14 mil pegam a doença diariamente, e sofrem pacas, mesmo vacinados. Esse liberou geral é que é louco e insano. Robson Luquesi – Mas estamos indo para um grau de normalidade. Afinal, as otoridade têm um acordo legal com os vírus e eles ficaram de respeitar todos os protocolos pra não contagiar a gente. Resta saber se os bichinhos vão mesmo cumprir o combinado… Regina Engelman – Tenho medo de perder alguém próximo por COVID … estou vacinada, saio quando necessário, e com máscaras ( não estou indo, igreja, cinema, shopping… mesmo com o relaxamento do governo). Janaína da Motta Lourenço – Já me chamaram de neurótica… por causa das minhas poucas saídas… mas não é porque que estamos vacinados que a vida voltou ao normal… acho. Maria Brezensky – Não! Estou aguardando a terceira e continuarei usando máscara. Daniel Zafran – Está certíssimo. Medo deviam ter os negacionistas e outros embusteiros. Vc tem cautela e cuidado com o próximo. Kol hakavod! Helvídio Mattos – Mesmo já ter tomado as três doses, não relaxo. Luiz Beto França – Medo, medo eu não tenho. Eu tenho pavor…Sei o que minha filha passou e como ela está hoje… Michel Dromed – Depois da terceira vacina, (fui voluntário) eu dei uma relaxada ao ar livre, mas sigo usando no transporte público, quando vejo aglomeração e reunião de família não passa de dez pessoas, obviamente, todos vacinados, mas sigo sim com medo. José Alves Bonfim – Eu acho que quem pega o vírus a reações são muito rápida…então todo cuidado é pouco …usar as máscara manter a distância…de aglomeração… Carlos Alberto Rodrigues Lara – Eu tive Covid e  tomo todos os cuidados possíveis e imagináveis!!! Infelizmente ainda estão morrendo muitas pessoas por dia aqui em São Paulo!!!! Pedro Luiz Costa Vijani – SP com aumento de casos apesar da vacina adiantada , já imaginou com o turismo no carnaval de blocos Alba Carvalho – Não mesmo!! Só saio de máscara N95 (duas, uma sobre a outra); não aglomero nem a pau; mantenho ainda isolamento (trabalhando remotamente); saio apenas para o básico: banco, farmácia, supermercado & afins; álcool gel até na salada…rsrs Lena Cardoso – Eu tenho e estou pasma, numa rápida saída de carro pelo bairro vi barzinhos lotados, todos sem máscara! Mary Zanin – Eu também tenho medo. Conheço muita gente que pegou depois das duas vacinas. Vanessa Pinheiro – Me cago (de medo) ! Tive em Agosto/2020 ainda tenho sequelas… A vida nunca mais foi a mesma. Sigo com segurança. José Bittar – Também tenho, ainda hoje tomei a 3° dose, vou continuar usando máscara, álcool em gel, distanciamento…Meus hábitos sanitários mudaram pra sempre. Ana Maria Onofre – Tem hora que dá vontade de pirar. Mas o medo e o respeito pela vida dos outros continua de prontidão. Máscara na cara e álcool gel de montão. Claudia Rolli – Estou mais aliviada depois de ler aqui que também não sou a única a temer e ter preocupação com o vírus Maria Silvia – Eu tenho. Ainda uso máscara mas confesso que relaxei um pouco e não vejo a hora de dar uns rolês. Talvez por morar no interior e ser menor os riscos de contágio.     Imagem de divulgação da Fiocruz/RJ    

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Cesta básica do Dieese vai a R$ 700: Por que a culpa é de Bolsonaro?

ContruirResistência recomenda uma leitura atenta da reportagem de Carolina Fortes publicada na revista #Forum: Com base neste valor, salário mínimo deveria ser superior a R$ 5,8 mil. Batata, café em pó, tomate, açúcar e óleo de soja foram os itens que mais sofreram aumento Com uma inflação galopante e uma má gestão econômica, o custo médio da cesta básica no Brasil atingiu o valor absurdo de R$ 700 em Florianópolis, capital de Santa Catarina. Este foi o maior preço registrado, mas São Paulo (R$ 693,79), Porto Alegre (R$ 691,08) e Rio de Janeiro (R$ 673,85) não ficaram muito atrás. Segundo levantamento do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese) feito em 17 capitais, 16 tiveram aumento no custo médio da cesta. As maiores altas foram registradas em Vitória (6,00%), Florianópolis (5,71%), Rio de Janeiro (4,79%), Curitiba (4,75%) e Brasília (4,28%). Com base na cesta mais cara, estima-se que o salário mínimo necessário deveria ser equivalente a R$ 5.886,50, o que corresponde a 5,35 vezes o piso nacional vigente, de R$ 1.100,00. A batata, o café em pó, o tomate, o açúcar e o óleo de soja são os itens que tiveram maiores altas de preços. Por que a culpa é de Bolsonaro Economista e ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), Marcio Pochmann afirmou, em entrevista ao Fórum Onze e Meia, por que que a principal responsável pelo aumento é a má gestão do governo de Jair Bolsonaro. Nos últimos 12 meses, a inflação ultrapassou 10%. “A inflação começou a se apresentar como um problema quando contaminou outros preços, especialmente em função da política de formação de preços que temos no governo Bolsonaro, liberalização e combinação da desvalorização da nossa moeda, com o aumento de determinadas commodities, como os combustíveis, que contamina outros preços, já que é a matriz do transporte brasileiro. Não é caro só para quem usa automóvel, mas também se traduz em elevação para tudo que o transporte carrega, como os alimentos”, explicou. Além disso, a política neoliberal também influencia, já que o produtor, com autonomia de vender para o mercado externo ou interno, acaba escolhendo exportar, onde consegue cobrar mais caro. “O Brasil não tem preços mínimos, as forças de mercado decidem onde produzir, o que produzir e como produzir. Não tem gestão, comando. Tem a liberdade de mercado, e isso traz impactos muito ruins especialmente para o trabalhador”, disse. Confira os itens que mais sofreram aumento A batata, pesquisada nas capitais do Centro-Sul, apresentou alta nas 10 cidades e as taxas oscilaram entre 15,51%, em Brasília, e 33,78%, em Florianópolis. O preço do quilo do café em pó teve alta destaque em Vitória (10,14%), Rio de Janeiro (10,06%), Campo Grande (9,81%) e Curitiba (9,78%). No caso do tomate, as maiores subidas foram observadas em Vitória (55,54%), João Pessoa (44,83%), Natal (42,16%), Brasília (40,16%) e Campo Grande (32,69%). O valor do açúcar aumentou em 15 capitais e as altas oscilaram entre 0,27%, em João Pessoa, e 7,02%, no Rio de Janeiro. O óleo de soja registrou alta em 13 das 17 capitais, entre setembro e outubro. Os maiores aumentos ocorreram em Vitória (3,22%), Brasília (2,40%), Campo Grande (2,16%), Rio de Janeiro (1,81%) e São Paulo (1,76%). Leia direto da fonte em: https://revistaforum.com.br/economia/cesta-basica-700-por-que-a-culpa-e-de-bolsonaro/  

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