Construir Resistência

23 de julho de 2021

Doria, Aécio e as bicadas no ninho tucano

Por Altamiro Borges Para os que tentam se viabilizar como “terceira via” nas eleições presidenciais de 2022, a situação não está nada fácil. Que o digam os tucanos, com as suas bicadas sangrentas no ninho. Só nos últimos dias, o governador paulista João Doria entrou em confronto com Aécio Neves e Geraldo Alckmin – dois ex-presidenciáveis do conflagrado e abatido PSDB. O bate-boca faz parte da disputa interna para definir o candidato do partido no próximo ano. As prévias estão previstas para novembro e já têm quatro postulantes: o demagogo de São Paulo, o governador gaúcho Eduardo Leite, o senador cearense Tasso Jereissati e o ex-prefeito Arthur Virgílio Neto, de Manaus. Conchavão e BolsoDoria Nesse quadro de disputa acirrada, o rejeitado Aécio Neves, hoje convertido ao bolsonarismo, aventou a possibilidade do PSDB nem ter candidato próprio em 2022. De imediato, João Doria, aparentemente o postulante mais forte nas prévias, atacou o mineiro, afirmando que ele “gosta de fazer conchavo político com o Centrão para prejudicar o Brasil”. O governador paulista, que já defendeu a expulsão de Aécio Neves da legenda, ainda atirou: “Eu tenho pena e lamento que ele ainda frequente o PSDB. Deveria ter tido a dignidade e ter pedido para sair… O fracasso subiu à cabeça de Aécio Neves. Ele não gosta de eleição, gosta de conchavão”. O ex-cacique tucano, que parecia ter virado pó, não se intimidou e retrucou. Afirmou que João Doria “nunca foi do PSDB” e que “deveria usar sua verve para explicar a humilhação a que está submetendo seu padrinho, o ex-governador Geraldo Alckmin, e para explicar o inesquecível Bolsodoria, esse sim, o único conchavo político que o PSDB fez com Bolsonaro”. Estilo agressivo do “João vacinador” As bicadas no ninho tucano devem ficar ainda mais sangrentas nos próximos meses. Humilhado por sua criatura na briga interna para definir o candidato à sucessão em São Paulo, Geraldo Alckmin ameaça deixar o PSDB. Aliados do “picolé de chuchu” dizem que ele está sendo sabotado pelo atual governador no seu sonho de voltar ao Palácio dos Bandeirantes. No seu estilo agressivo e sem escrúpulos, João Doria joga pesado para se viabilizar como candidato da sigla, como aponta a Folha: “Filiações de prefeitos, vídeo com o mote ‘João vacinador’ e um site de divulgação de material para militantes marcam a ofensiva de João Doria para obter maioria de votos entre filiados nas prévias presidenciais para 2022”. “Doria deu início à campanha interna no último fim de semana, quando compareceu a eventos tucanos em Mato Grosso do Sul e Goiás. Na noite de quarta-feira (14), o diretório do PSDB de São Paulo, controlado pelo governador por meio de seu secretário Marco Vinholi, filiou 65 prefeitos e vice-prefeitos, alcançando 231 prefeitos no estado de 645 cidades”. “No evento, foi divulgado um vídeo de propaganda que dá o tom da campanha, com críticas ao presidente Jair Bolsonaro e ao ex-presidente Lula, descritos como ‘negacionista’ e ‘corrupto’, respectivamente. Já Doria é apresentado como ‘João, o vacinador’ e ‘a cara limpa da paz e do consenso’, alguém que ‘não viveu em berço de ouro’ como se pensa”.   Altamiro Borges é jornalista, editor do blog do Miro e presidente do Centro de Estudos da Mídia Alternativa Barão de Itararé   Matéria publicada originalmente no link abaixo https://altamiroborges.blogspot.com/2021/07/doria-aecio-e-as-bicadas-no-ninho-tucano.html

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Utopia e distopia na minissérie Years and Years

Por: Francisco José Nunes Análise sem spoiler! A minissérie #YearsandYears (BBC/HBO – 2019), criada por Russell T. Davies, causou muito impacto porque, segundo muitos comentários, pegou pesado com o uso da distopia. Os seis episódios da minissérie acompanham a vida da família Lyon por 15 anos. Tudo começa em uma noite crucial, em 2019. Os principais membros da família são: Muriel Deacon (Anne Reid) é a matriarca da família, uma avó devotada, faz críticas perspicazes sobre o cotidiano; Stephen Lyons (Rory Kinnear) é o filho mais velho, mora numa linda casa em Barnsbury (Londres), é casado com Celeste, pai de duas garotas (Bethany e Ruby), tem uma ótima condição financeira, é calmo, sorridente e comporta-se como o pacificador; Celeste Bisme-Lyons (T’Nia Miller) é casada com Stephen, é contabilista, moderna, inteligente, estilosa, mãe de Bethany e de Ruby. Também fazem parte da família Lyons: Daniel Lyons (Russell Tovey) o terceiro filho, trabalha no Departamento de  Habitação da Prefeitura de Manchester, é casado com Ralph (Dino Fetscher) que é professor do ensino fundamental; Rosie Lyons (Ruth Madeley) é a mais jovem das Lyons, é cadeirante, nasceu com espinha bífida (defeito congênito na medula espinhal), mãe solteira de Lee e Lincoln, de dois pais diferentes, trabalha como chef de cozinha numa escola local, é muito divertida; Edith Lyons (Jessica Hynes) é a segunda filha, é ativista e internacionalista da causa ambiental, viajou bastante pelo mundo; Bethany Bisme-Lyons (Lydia West) é a filha mais velha de Stephen e Celeste, é uma aluna brilhante, tímida, obcecada por transumanismo, implantou um telefone na mão e pretende fazer upload da sua consciência para a nuvem. A personagem que não pertence à família Lyons, mas que influencia muito a vida familiar e a sociedade britânica é Vivienne Rook (Emma Thompson). Ela é uma empresária que entra nas disputas políticas como uma representante da extrema-direita. Faz declarações absurdas, mas que com o tempo vão sendo normalizadas. Através de várias eleições vai galgando o poder até se transformar numa governante poderosa e fascista. Para refletir sobre as questões colocadas pela série é inevitável mencionar o governo da Primeira-Ministra Margaret Thatcher e a sua herança maldita. Ela exerceu o poder no Reino Unido entre 1979 e 1990. Combateu o chamado “Estado de Bem Estar Social”, política econômica de Estado, implantada no pós-guerra, que buscava garantir o acesso às necessidades básicas para todas as pessoas. Por outro lado, ela impôs a política econômica do Liberalismo, reduzindo a ação do Estado nas áreas estratégicas da sociedade (saúde, educação, energia, transporte, abastecimento, moradia). Introduzindo as famosas privatizações. A sua filosofia política está bem resumida nesta declaração: “Não existe isso que chamam de sociedade. Existem indivíduos, homens e mulheres, e existem famílias. E o Governo só pode agir através das pessoas, mas são as pessoas que devem zelar por seu próprio interesse. Todos devemos cuidar de nós mesmos, e depois, também, de nossos vizinhos”. Esta declaração, infelizmente, soou como música para muitos ouvidos. Ela estimula absurdamente o individualismo. Na prática, Thatcher atacou os sindicatos, os partidos políticos e todas as formas de organização social. Isolar as pessoas é a melhor forma para dominá-las. Ao assumir o poder, Thatcher pegou o Reino Unido com uma inflação de 25% e uma taxa de desemprego de 17%. Mas tirou proveito desta situação para implantar as malfadadas “políticas de austeridade”. Na condição de principal representante do conservadorismo, suas bandeiras eram “a família e a segurança”. Sua grande batalha inicial foi contra os sindicatos, principalmente o sindicato dos mineiros. Que ela venceu na base da pressão econômica e da repressão policial. Simultaneamente ela desqualificou os partidos políticos, principalmente o Partido Trabalhista.  No plano social, Thatcher: interrompeu o programa de moradias populares, isso prejudicou muito a juventude, porque os jovens ficaram sem opções para sair da casa de seus pais; fez inúmeras terceirizações no sistema de saúde NHS (o SUS britânico); apoiou a famigerada lei conhecida por “Seção 28”, que proibia as escolas de “promover o ensino da aceitabilidade da homossexualidade”, essa lei vigorou entre 1988 e 2003; dentre outras malvadezas. Após 11 anos no poder o saldo foi o seguinte: para uma líder política que “defendia a família e a segurança”, a taxa de divórcio aumentou 11%; o número de roubos aumentou 53% e de crimes em geral aumentou 34%; o número de famílias monoparentais aumentou acentuadamente. Provavelmente, a causa dessa hecatombe social encontra-se na política econômica adotada: que provocou desindustrialização; redução dos direitos trabalhistas e sociais; e, aumentou o abismo entre os mais ricos e os mais pobres. Este breve panorama do Governo Thatcher facilita a compreensão dos dilemas colocados pela série Years and Years. Não se trata de dizer que Vivienne Rook seja uma sósia de Margaret Thatcher, Vivi “herdou” o estado de terra arrasada deixado pelas políticas de Thatcher. Os políticos de direita, depois que fracassam, abrem caminho para o fascismo. Logo no primeiro episódio Vivienne diz: “Eu não entendo mais o mundo. Antes esquerda era esquerda, direita era direita, os EUA eram os EUA”. Essa tática dos políticos de extrema direita é típica. Criar confusão no sentido das definições. Mas, infelizmente, essa declaração tem grande aceitação popular.  Considerando que a maioria das pessoas se recusa a assumir as responsabilidades necessárias para viver em sociedade. Isto é, para viver em sociedade é preciso: dedicação ao estudo dos problemas e das soluções propostas; participação nos debates e nas decisões; enfrentamento dos conflitos e da pressão dos mais poderosos. Infelizmente, a maioria das pessoas prefere ficar omissas, “neutras”, não querem “polarizar”. Resultado: a sociedade afunda, entra em decadência. A série Years and Years coloca um turbilhão de problemas para serem enfrentados: a devastação ambiental, o abismo entre ricos e pobres, a precarização das condições de trabalho, as crises econômicas, o negacionismo, o terraplanismo, a causa dos refugiados e imigrantes, a homofobia, a xenofobia, entre outras. Neste sentido, a série apresenta um mundo distópico. Entretanto, a própria série indaga: “Pode uma família comum mudar o mundo?”. É na tentativa de dar a resposta que a série termina. Isto é,

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O desapego abre novos horizontes e possibilidades

Por Beatriz Herkenhoff                           Nesse tempo de isolamento tenho refletido sobre o apego e o desapego, sobre o            preenchimento dos vazios e a organização dos espaços por onde transitamos e vivemos. Nossa casa é a expressão do nosso ser. Nela está contida nossa história pessoal e familiar, amores vividos com intensidade. Também momentos de separações, de perdas e de elaboração de lutos. Memórias alegres da casa cheia com crianças e jovens circulando e criando momentos mágicos. Nas paredes de nossa casa estão gravadas experiências de plenitude, de alegria e de gratidão. Recordações de festas, happy hour com amigos, celebrações religiosas, almoços em família, do cheiro e cores dos alimentos preparados com tanto amor e delicadeza. Lembranças dos obstáculos superados e de conquistas que reafirmam nossa autoestima e potência de vida. Em 2016 tive acesso ao livro de Marie Kondo “A mágica da arrumação – a arte japonesa de colocar ordem na sua casa e na sua vida” (2015). Naquela ocasião tinha acabado de me aposentar e foi muito rico usar a metodologia proposta para descartar e ressignificar cada objeto que compunha minha casa. Nesse momento de confinamento, em que passamos a maior parte do tempo em nossa casa, resgatei dicas desse precioso livro para dar um novo colorido ao meu espaço. Para Marie Kondo, organizar tem o objetivo de restaurar o equilíbrio entre as pessoas, seus pertences e a casa onde moram. Com esse espírito, decidi organizar minha casa em 2016. Pensei que iria encontrar pouca coisa para descartar, pois sempre fui considerada organizada e não sou consumidora voraz. Nunca acumulei roupas, utensílios ou outros objetos decorativos e sou bem desapegada na hora de decidir sobre o que descartar. Mas, surpreendi-me! A técnica proposta é muito interessante. Ela orienta para decidirmos o que manter e o que descartar por categoria, começando pelas roupas, papeis, livros, utensílios e por último objetos afetivos, com os quais temos vínculo emocional. O segredo é só mudar de categoria quando eliminamos tudo o que queremos da anterior. É tirar tudo do armário, pegarmos em cada objeto perguntando: essa roupa (papel, livro, enfeite) me dá alegria? O fato de pegarmos no objeto tem o sentido de energizá-lo e estabelecermos uma relação de gratidão, de resgate do significado daquele objeto em nossa vida, mas, também de desapego, da coragem de despedir, quando ele já não nos traz alegria e felicidade. Para Marie Kondo, a emoção genuína da alegria está no corpo e nos pertences. Por isso, descartar aquilo que não nos faz sentir bem gera felicidade. A mágica da organização da casa É pegar em cada objeto e perguntar se ele me dava alegria foi muito significativo e terapêutico. Descobri que tinha guardado muito mais do que imaginava. Que era mais apegada do que supunha. Descartar é um processo decisório que diz respeito aos nossos sonhos e projetos. O que queremos ser? Em que aspectos queremos mudar? A decisão sobre que objetos desejamos manter é, na verdade, uma decisão sobre que tipo de vida desejamos viver. Quando desapegamos de coisas significativas, fechamos ciclos, nos despedimos de um passado que ainda nos amarra e impede de viver um presente mais leve. Quando guardamos coisas pensando que iremos precisar delas no futuro, ficamos também apegadas a um futuro que poderá não acontecer. O apego me prende ao passado e ao futuro e me impede de focar no presente. O que é realmente fundamental para a minha vida? Preciso guardar e acumular tantas coisas? E foi isso que fiz naquela ocasião quando doei roupas, sapatos, livros. Joguei fora apostilas de cursos que ministrei como professora e que ainda guardava porque achava que um dia iria precisar. Nesses gestos, pude me despedir de minha profissão, da alegria, do prazer e da plenitude que senti nos 33 anos em que fui assistente social e professora universitária. Sou grata aos meus colegas de profissão e de trabalho, sou grata aos meus alunos. Mas, tive que fechar processos para ir em frente! Ao agradecer por tudo que vivi, eu me libertei do passado para ficar mais inteira no aqui e no agora. Tive que me desapegar para encontrar o novo que eu não conseguia perceber. O apego é limitante, nos faz ficar estagnados no tempo e em pensamentos saudosistas. O apego pode nos transformar em acumuladores. Acumulamos tanto que nos perdemos em nosso próprio espaço físico e existencial. Quando organizamos a casa, o ar que circula nela fica mais limpo e fresco. Quando o ambiente está em ordem, ganhamos tempo para fazer as coisas que nos dão prazer. O destino que nos conduziu a cada um dos nossos pertences é precioso e sagrado. Por isso é importante despedir daquele objeto com gratidão e desejar que faça uma bela jornada daqui em diante. Tudo na vida é passageiro e transitório. Deixar ir é um movimento que liberta. O efeito da organização pode transformar nossa vida. Em tempos de #pandemia, em que circulei muito pouco. Minhas roupas ficaram guardadas, usei o mínimo do mínimo. Mesmo procurando ficar bonita e arrumada dentro de casa, dez mudas de roupa foram suficientes para passar o primeiro ano de isolamento. Percebi como precisamos de menos para viver, como podemos contribuir para que a fartura seja distribuída de forma mais igualitária. Lembrei-me de Marie Kondo e esvaziei novamente o armário para pegar em cada peça de roupa, agradecer e me despedir quando percebia que não teria tanta serventia. Ao fazê-lo, relembrei de momentos de muito amor e prazer que aquelas roupas me proporcionaram, mas, percebi que tinham cumprido o seu papel. De agora em diante elas aqueceriam e alegrariam a vida de outras pessoas. E muitas, por estarem passando por momentos de dificuldade financeira, sentiriam um alento e um toque com a chegada de roupas coloridas e afetuosas. As minhas roupas carregam muita energia positiva. Ao desapegar-me e doá-las, a minha benção sempre chega ao novo dono. Eu amo quando dou um alimento

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Concerto para trompete em tenha dó

Por Luis Otavio Barreto Eu vim chorar pitangas, mas ninguém eh obrigado a aguentar meus azedumes; cada qual com os seus. Apaguei. Permita-me, no entanto, confessar que tô com uma saudade de uma época tão menos cacete. Eu resolvi que esse ano aprenderia algo novo. Entrei numa universidade e fui para uma outra graduação. Ontem procurei o “seu Nilo”. Pedi aulas particulares de trompete! Ele, não me conhece. Perguntou se eu sabia música (isso significa “Você sabe ler partitura?”). Acenei que sim. Hoje, às 19h, terei a primeira aula. Ainda não sei como será, mas sei, pq ele alertou, que tem protocolos por causa da #Covid-19. Estou fazendo isso porque não gosto das coisas que estou vendo vir pelo horizonte. Preciso ocupar, com gosto, a mente. Estou esgotado, meu semblante está cansado! Ontem mesmo, num #whatsapp, alguém me disse que fico um “tesão” com essas olheiras. Eu parei, respirei, deu uma puta vontade de chorar, rir, xingar, mas fiquei um pouco envaidecido e curioso. A coisa só piorou quando, em seguida, veio o seguinte “tenho tara em homens esculhambados”. Sério, me deu uma vontade de arrancar a roupa e sair gritando até o carro no pinel vir me apanhar. “Esculhambado”. ES-CU-LHAM-BA-DO! Tudo isso, o governo, a carestia, um cacetão (mano, pelamor…eu devo ter mais uns 30/40 anos de vida, vai…) um cacetão d’uma nave levando uns caras que não valem um tostão furado… gente…eu não tenho maturidade pra lidar com aquilo…é tudo surreal demais… e, ainda, ESCULHAMBADO… se eu não aprender a tocar trompete lindamente ou se tomar bomba na faculdade… aí, como diz Sávio, um meu aluno; ehpacabá! Luis Otavio Barreto é músico pianista e professor de língua portuguesa.

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